O Barquinho Cultural

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quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

A vida como ela é

Woody Allen é engraçado. Sabe fazer filmes engraçados mesmo tratando de temas sérios e delicados. Neste Você Vai Conhecer o Homem de Seus Sonhos, não lida com nenhum grande tema caro à humanidade, apenas com dramas comuns da atualidade como a busca da felicidade, a expectativa, a frustração, as decepções, os relacionamentos complicados, a recusa em envelhecer, as ilusões (que às vezes são melhores que os remédios, diz em certo momento).

É um emaranhado de situações que vão se costurando para resultar na dissolução de duas famílias e as tentativas de se construir outras mais felizes. No final, a impressão que se tem é a de que não há uma ideia central, um fio condutor, reforçada pela frase de MacBeth (Shakespeare) que o narrador fala no começo ("A vida é cheia de som e fúria e no final não significa nada").

Acho que é isso. Muito barulho por nada. Nenhuma lição de moral, nenhum julgamento. As pessoas cometem as maiores atrocidades morais e não há punição, a não ser as próprias da vida. No fundo todos só querem ser felizes. E alguns conseguem.

É a história de dois casais ingleses, vividos por Anthony Hopkins e Gemma Jones, e a filha e genro deles, por Naomi Watts e Josh Brolin. Hopkins deixa a mulher após 40 anos de casamento ao não admitir que esteja envelhecendo e parte em busca da juventude, malhando, andando de carro esportivo e ao final se envolvendo com uma ex-prostituta (Lucy Punch, mais nova que sua filha).

A mulher (Jones), inconformada com a separação, passa a se consultar com uma vidente (Pauline Collins) pra lá de charlatã, que lhe dá em troca de seus honorários vários chavões, como o que dá título ao filme. Ela ainda reclama do genro (Brolin), um ex-médico que aventurou-se pela literatura mas não emplacou mais nenhum sucesso depois do primeiro, e vive (às suas custas) esperando pelo telefonema de uma editora que o queira publicar.

Watts obviamente não se conforma com a inatividade do marido e vai à luta, empregando-se em uma galeria de arte de Antonio Banderas, por quem irá alimentar depois uma paixão não correspondida.

Enquanto a mãe vive repetindo as "previsões" da cartomante, crendo piamente em suas realizações, Brolin vai se envolvendo com uma vizinha, que só se veste de vermelho (por que será?), vivida por Freida Pinto.

E assim a história segue, com desfechos que às vezes surpreendem (como o de Jones), às vezes enervam (como o de Brolin). Ou seja, não há linearidade, não há maniqueísmo. É a vida como ela é, sem retoques, e pintada em um tom sépia e com uma trilha jazzística que tornam o filme muito belo, com grandes interpretações e a gente sai do cinema com a sensação de que a vida, ao contrário do bardo inglês, tem, sim, algum sentido. O que damos a ela.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Uma graça de cantora

Vanessa da Mata é uma graça, não consigo achar adjetivo mais apropriado. Poderia dizer que ela é talentosa, excelente cantora, linda, simpática, mas esses servem a qualquer uma. Vanessa, em minha opinião, tem graciosidade, que faz com que todos os outros predicados orbitem em torno desse que elegi como meu preferido.

No show que ela apresentou em São Paulo esse fim de semana (10 e 11 de dezembro), no condenável Citibank Hall, demonstrou uma performance que me fez chegar a essa conclusão. Baseado em seu último CD, Bicicletas, Bolos e Outras Alegrias, o show foi um primor para mexer com os sentidos.

Com um longo branco todo cheio de babados (não sei se o nome é esse mesmo), com uma flor da mesma cor nos belos e incríveis cabelos, a mato-grossense de voz forte e aveludada iniciou o espetáculo sentada em um praticável, à esquerda do palco, cantando As Palavras, do disco novo, composição sua, em que fala para o amado tomar cuidado com o que diz, porque as palavras, afinal, ferem ("escolha os versos para ser meu bem / e não ser meu mal / reabilite o meu coração").

Em seguida se levanta e vai de O Tal Casal, também dela e do novo CD, falando de uma reconciliação ("voltávamos a ser então o tal casal / apaixonado, apaixonado"). Ela fala de amor de uma maneira muito doce, sem ranços, não se atém a dores de cotovelo e perdas irreparáveis. Canta o amor vivido, puro, bem adequado a sua figura - esguia, mas de um romantismo latente.

Mesmo em uma canção que fala de rompimento, como , dela e de Lokua Kanza, ela coloca um traço de generosidade que a faz uma grande mulher, apesar da firmeza da decisão ("vá se descobrir / vá crescer / entender e saber").

Ela cantou várias outras canções do disco novo - que não me canso de ouvir - e outras mais antigas, como os hits Amado, Vermelho, Boa Sorte, Ai, ai, ai. E ainda uma de Roberto, que, infelizmente não me lembro o nome, revivendo o primeiro CD, quando cantou Nossa Canção, de Luiz Ayrão, mas sucesso na voz do Rei.

A nota negativa fica por conta da casa, que eu detesto, pela péssima mania de juntar o máximo de gente no espaço disponível, o que faz com que fiquemos todos espremidos, e pela plateia sem noção que insiste em fazer pedidos aos garçons no decorrer do espetáculo, atrapalhando a boa audição e visibilidade do show. Fora isso, um show belíssimo de uma artista de quem eu gosto muito.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Imagina, 30 anos sem Lennon

Ontem, 8/12, completaram-se 30 anos que um maluco de nome Mark Chapman, sem motivo aparente, disparou quatro vezes contra o ex-beatle John Lennon, que contava com meros 40 anos e um currículo respeitoso na área musical e comportamental.

Morria uma lenda, um músico que formou simplesmente o mais influente grupo de rock de todos os tempos, ultrapassando inclusive as fronteiras do rock.

Como muitos, eu me lembro muito bem o que estava fazendo e onde estava quando soube da notícia. Ouvi em casa e corri para a rua.

Encontrei Cristina na frente da igreja do bairro e ficamos a falar sobre o que acontecera. O mundo era outro, sem internet, Google, orkut, ainda nos informávamos pelos meios tradicionais: rádio, TV, jornal.

Não me lembro em qual desses veículos soube da notícia. Mas me lembro dos noticiários noturnos da TV, mostrando o choque mundial que tinha sido sua morte. Os rádios tocavam sem parar músicas antigas dele e do disco recém-lançado, Double Fantasy, como (Just Like ) Starting Over, Woman, Beautiful Boy, Watching the Wheels - minhas preferidas.

Esse álbum era seu primeiro desde 1975, quando se deu um tempo para curtir o filho que tivera com Yoko, Sean (hoje um músico que adora os Mutantes, rs), tentando reparar o erro que cometeu com o primeiro filho, Julian, com Cynthia, que praticamente não viu crescer dada a febril rotina de superstar.

Foi um momento de grande tristeza, como se tivesse perdido um ente querido, sentimento compartilhado por milhões mundo afora, tenho certeza. Acabava-se, ali, a esperança de os Beatles tocarem juntos novamente, desejo alimentado nos últimos dez anos, desde a separação do grupo.

Eu aprendi a gostar dos Beatles exatamente no ano que eles se separaram. Claro que quando pequeno ouvia as músicas, principalmente pelos serviços de alto-falantes dos parques de diversão, e pelo rádio que minha mãe mantinha o tempo todo ligado enquanto cuidava dos afazeres domésticos. Mas em 1970 tive um contato maior, quando meu pai comprou uma loja que vendia discos.

Na época, começaram a sair os compactos simples de cada um deles, todos com a maçã verde no selo Apple, o que me fez identificar de pronto que se tratavam de singles dos ex-integrantes do grupo. Eram eles Mother, de Lennon; Another Day, de McCartney; My Sweet Lord, de Harrison; e Photograph, de Starr (ou It Don't Come Easy, não me lembro muito bem).

O disco Abbey Road, o último deles a ser gravado (mas lançado antes de Let It Be, gravado antes mas lançado depois), me impressionou muito. Primeiro pela capa, aqueles quatro cabeludos atravessando uma faixa de pedrestes da rua que dá nome ao álbum. Desde então quis ter cabelos compridos, o que fiz por vários anos.

Depois as músicas, belíssimas, surpreendentes, diferentes de tudo que eu ouvira, a começar por Come Together, com aquele som surdo no início, cantada por Lennon. Impacto semelhante eu teria ao ouvir Sgt. Pepper's e por aí vai. Incrível a genialidade da dupla Lennon & McCartney.

Poucos anos depois, saíram duas coletâneas, o álbum azul e o álbum vermelho, com as músicas que só tinham saído em compactos, quando então pude conhecer mais sobre a obra do quarteto. Na verdade, só passei a comprar os discos nos anos 90, quando completei a coleção.

E depois os póstumos Past Masters, Live at BBC e  os três volumes de Anthology, depois os DVDs e os shows de Paul. Enfim, contam-se aí 40 anos de admiração a essa grande banda, que, depois da morte de Lennon, ainda viria a perder, em 2001, o guitarrista George Harrison.

É estranho a gente ver um ídolo morrer. Não vivi a época em que foram-se embora Jimy Hendrix, Jim Morrison, Janis Joplin, Brian Jones, ( os 4 J do rock), mas imagino que o gosto que a geração deles sentiu foi a mesma que a minha, uma sensação de amargor, como se o mundo deixasse um pouco de ser colorido.

P.S: Olha que coincidência, meu post anterior foi sobre Paul McCartney, e agora John Lennon. Mas, como dizem, nada é por acaso, não é?