![]() |
Testemunha e protagonista de uma época |
Os anos 1980 foram um barato para quem era jovem à época e gostava de música jovem. A barra ainda era pesada – o fim da ditadura só veio em 1985, mas o presidente ainda foi eleito indiretamente, e nem tomou posse: o mineiro Tancredo Neves, avô daquele aí, morreu antes de pegar a faixa presidencial do general Figueiredo (aquele que preferia o cheiro de estábulo ao do povo).
Contextualizando, para quem não viveu aquela época (vou
relatando de memória, que pode falhar, mas é melhor que recorrer aos livros –
ou ao Wiki – para falar sobre um período que eu testemunhei, né?): o Brasil
musical vinha de um período de entressafra; os grandes nomes da MPB ou estavam
lá fora, exilados ou autoexilados, ou aqui enfrentavam a tesoura da censura.
O bom rock dos anos 70 era meio marginal (no sentido de não
figurar na mídia), e nas rádios e TVs o que se escutava eram grupos brasileiros
cantando em inglês e as breguices de sempre; novos nomes do Nordeste apareciam em
festivais de música promovidos pelas TVs, que não tiveram a importância
daqueles da Record dos anos 1960, mas revelaram gente boa que está aí até
agora. Tínhamos Raul, Mutantes (sem Rita), rock rural, progressivo, algum
projeto de punk, um metal resistente, enfim, uma cena que buscava quebrar a
grossa mordaça imposta pelos militares à criação.
Aí, nos 1980, na onda dos gritos pela democratização que
começaram a pipocar, que culminaram – mas não terminaram ali – com o movimento
pelas Diretas Já, eis que começam a surgir de toda a parte bandas de rock que
vinham com uma linguagem nova, com influências variadas, nutridas pelas
novidades que apareciam na Inglaterra, nos EUA, na Jamaica e pelo mundo afora.
Vinham com uma postura que, se não se podia chamar de revolucionária
ou militante, ao menos trazia um comportamento rebelde, moderno, para acabar
com a caretice chata que os anos duros impuseram à sociedade. Vieram de todos
os cantos, mesmo: São Paulo, Rio, Porto Alegre, Salvador, Brasília e até de Belo
Horizonte. E os estilos também foram os mais variados: do nascente new wave ao
hard rock mais cru, passando pelo punk rock, heavy metal e outros sem
classificação visível.
A sensação era de que o importante era se divertir: nada de
música de protesto, de levantar bandeira, seguir passeata. Os nascidos no
período da distensão lenta, gradual e segura, iniciada com Geisel em 1974, não
pareciam querer embarcar na onda da luta contra o regime e a cultura pop vinha
com tudo na onda da globalização. Programas de TV, cinema, videogames, as discotecas,
a soul music brazuca, fanzines, um certo comportamento libertário herdado dos
hippies e também dos movimentos estudantis e uma sociedade de consumo que os
anos de chumbo conseguiram assentar em nossas terras.
É nesse caldo de cultura que surge a música jovem dos anos
1980. E um, entre muitos outros caras, captava todo esse momento e irradiava
pelos meios de que dispunha – em gravadoras de discos, no rádio, na TV, em jornais,
revistas, e bandas – o universo que se espalhava pelo Brasil e pelo mundo.
Antonio Carlos Senefonte, o Kid Vinil, funcionava como uma
antena parabólica, absorvendo o máximo que pudesse do que se criava pelo mundo,
e percebia como essa nova onda irradiava aqui e levava garotos imberbes e
garotas ainda adolescentes a empunharem instrumentos e saírem tocando nas
garagens, porões, clubes e onde mais fosse possível.
O que Kid Vinil viu, ouviu, viveu e passou para frente agora
pode ser conferido no livro que o jornalista Ricardo Gozzi e o músico Duca Belintani escreveram: "Kid Vinil, Um Herói do Brasil – Biografia Autorizada" (Edições Ideal, 160 páginas, R$ 39,90),
será bem-sucedido se conseguiu retratar o turbilhão que foi aquele período, fundamental
para o que se fez depois – tanto que nas baladas de hoje não raro há o momento retrô,
em que DJs (como o próprio Vinil o é) botam pra rodar hits oitentistas. E muitas
dessas bandas ainda estão na ativa.
O livro está em pré-venda pelo site Ideal Shop,
e vem junto com o 60º aniversário do Kid, a completar dia 10 de março. O background
dos autores: Gozzi é autor de uma biografia dos 18 anos dos hilários Velhas
Virgens e de um livro sobre a Democracia Corintiana, escrito junto com ex-jogador Sócrates, e coeditor do site Roque Reverso;
Belantini foi guitarrista de Vinil – e quem teve a ideia de fazer o livro.
Enquanto isso, vamos relembrar algumas das bandas formadas
por Kid Vinil e músicas que chegaram a alcançar sucesso nos programas de auditório
e até entrar na abertura de uma novela da Globo (“A Gata Comeu”, de Ivani
Ribeiro, direção geral de Herval Rossano, exibida de abril a outubro de 1985 às
18h, com a música “Comeu”, de Caetano Veloso):
Verminose: misto de punk rock e rockabilly, formada, à época, por Kid Vinil, Lu Stopa, Fábio Gas, Trinkão e Jean Trad. Aqui, o clipe “Tô Sabendo”, gravado no teatro Lira Paulistana, palco da vanguarda da cidade, nos anos 1980:
Magazine: já na sintonia do new wave, com remanescentes do Verminose Ted Gaz, Lu Stopa e Trinkão. Aqui, o hit “Sou Boy”, videoclipe oficial:
Kid Vinil e os Heróis do Brasil: projeto mais blues, rockabilly e rockão. Eram André Christovam (guitarra), Kuki (bateria) Raska (ou Newton) no baixo e Ari Holland (teclados). Sem Vinil, a banda atacava do mais puro blues de Chicago, com o nome de Oldsmoblues. Aqui, “A fila do INPS”, em uma gravação amadora feita no Masp, em 1987 (a qualidade é péssima, mas é o que tem pra hoje):
Kid Vinil Xperience: após anos atuando como jornalista e apresentador em várias emissoras de rádio e TV e engrenar uma carreira de DJ, Kid volta aos palcos com a banda de apoio Xperiente: Carlos Nishimiya, na guitarra; Fábio McCoy, na bateria, e Marcello Morettoni, no baixo. Aqui, o hit do Magazine “Tic Tic Nervoso”, em apresentação do Sesc Sorocaba, em 2013:
(Fontes: site oficial de Kid Vinil, Roque Reverso, algo de Google e o resto da cachola desse velho blogueiro)
Nenhum comentário:
Postar um comentário