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quarta-feira, 15 de outubro de 2025

Minha vinilteca: Adoniran Barbosa & Convidados

 MINHA VINILTECA

Nesta nova série, vou compartilhar minha pequena vinilteca. São apenas 123 títulos. Um nada diante de colecionadores possuidores de andares inteiros de discos. Mas é a MINHA coleção. Cada um desse vinis tem uma história, um afeto, um por quê. São 75 LPs de artistas brasileiros e 48 de fora do Brasil. Sobre cada um, vou contar coisas como quando e em que contexto os adquiri ou ganhei (se me lembrar e houver anotação), a ficha técnica (se não houver encarte, recorro à internet) e alguma curiosidade, de minhas memórias ou disponíveis em resenhas. Claro que a maiorias dessas informações qualquer IA pode lhe dar em segundos (faço uso de alguma, sim, quando não tiver outro meio de pesquisa), mas a minha emoção de quando escolhi o disco na loja, o coloquei no prato e depositei a agulha isso nenhum robô pode reproduzir. E é isso que quero lhes oferecer. As postagens seguem ordem alfabética. Intercalo LPs nacionais e internacionais.


Por que comprei este disco

Em 1981, eu participei de um grupo de teatro amador na paróquia de meu bairro, Vila Palmares, em Santo André. Nós montamos a peça "A Invasão", de Dias Gomes, escrita 20 anos antes. O texto trata de famílias expulsas de seus barracos em uma favela por causa de uma enchente que ocupam um hospital inacabado para ter um teto.

Ali, são submetidos à exploração de um malandro que cobra deles para manter a polícia longe; ao oportunismo de um deputado que os ludibria em busca de votos e popularidade; à fome, falta de emprego, humilhações de toda sorte. Para resumir, no texto original, os sem-teto se organizam e expulsam todos os exploradores do prédio, tomando posse definitiva.

O final de Dias Gomes, um autor de esquerda, trazia a mensagem de que era possível o poder popular por meio da organização, da luta, da solidariedade. Mas a peça foi escrita em  1962... Veio 1964 e achamos - nós do Grupo Tupi - que esse final não condizia com a realidade. E, no nosso desfecho, a polícia sentava o pau e todos eram expulsos do edifício.

Esse final precisava de uma música apropriada. E "Despejo na Favela", indicação de nosso orientador, Tim Urbinati, do Grupo Forja, veio a calhar.

O momento de compra

Encontrei este LP, "Adoniran Barbosa & Convidados", não me lembro em que loja, e o comprei em 20 de agosto de 1981. O disco foi produzido por Mariozinho Rocha, gravado nos estúdios da EMI-Odeon em maio de 1980, para comemorar os 70 anos de Adoniran, nascido João Rubinato em 6 de agosto de 1910.

A faixa "Despejo na Favela", de Adoniran, tem o acompanhamento de Gonzaguinha (Luiz Gonzaga do Nascimento Júnior, 1945/1991) e versos que casavam esplendidamente com nossa montagem:

"Quando o oficial de justiça chegou

Lá na favela e, contra seu desejo

Entregou pra seu Narciso

Um aviso, uma ordem de despejo


Assinada, seu doutor

Assim dizia a petição

Dentro de dez dias quero a favela vazia

E os barracos todos no chão


É uma ordem superior

Oh, oh, oh, oh, meu senhor

É uma ordem superior

Oh, oh, oh, oh, meu senhor

É uma ordem superior


Não tem nada, não, seu doutor, não tem nada, não

Amanhã mesmo vou deixar meu barracão

Não tem nada, não, seu doutor

Vou sair daqui pra não ouvir o ronco do trator


Pra mim não tem problema

Em qualquer canto me arrumo

De qualquer jeito me ajeito

Depois o que eu tenho é tão pouco


Minha mudança é tão pequena

Que cabe no bolso de trás

Mas essa gente aí, hein, como é que faz?

Mas essa gente aí, hein, como é que faz?


Oh, oh, oh, oh, meu senhor

Essa gente aí como é que faz?

Oh, oh, oh, oh, meu senhor

Essa gente aí como é que faz?


Oh, oh, oh, oh, meu senhor

Essa gente aí.."


Os detalhes técnicos

O LP tem produção executiva de Fernando Faro (1927/2016), que assina um belo texto no encarte, com fotos de brinquedos construídos pelo compositor. O encarte traz ainda uma ilustração do gigante Elifas Andreato:


"E ali do lado, cigarro na boca, ele trabalha.

Como vem fazendo durante boa parte desses 70 anos de vida.

Buscando fundo na memória, ouvindo de vez em quando os amigos, e percorrendo ruas e bares, ele vai refazendo pedaço a pedaço, sem muita ordem, utilizando o metal, a madeira, os fios, e tambám a palavra e o samba, a humana e muito doce paisagem dessa cidade - uma cidade que muda a cada minuto, e se deforma e se reforma, e se transfigura. É São Paulo que ele constrói. Ou reconstrói."



A direção de produção é de Mariozinho Rocha, com arranjos e regência do Maestro José Briamonte. Foram técnicos de gravação Guilherme Reis e Dacy; mixagens Franklin e Nivaldo Duarte; corte Osmar Furtado; capa de Elifas Andreato; fotos de Alexandre Sarda; arte final de Alexandre Huzak; coordenação gráfica Tadeu Valério e revisão gráfica Hagnea Mazetto. O produtor fonográfico é EMI-Odeon Fonográfica, Industrial e Eletrônica S.A.


As participações especiais e músicos convidados

Os Amigos que o acompanham nessa belíssima homenagem são Clementina de Jesus, Clara Nunes, Carlinhos Vergueiro, Djavan, Elis Regina, Luiz Gonzaga Jr., MPB4, Conjunto Nosso Samba, Roberto Ribeiro, Talismã e Seu Conjunto e Vania Carvalho.

Os músicos são Dino Sete Cordas (violão 7 cordas), Cesar Faria (violão 6 cordas), Carlinhos Antunes (cavaquinho), Marçal Filho, Nilton Marçal, Elizeu Félix, Luna, Jorginho e Geraldo (ritmo), Netinho e José Nogueira (saxofone), Nelsinho (trombone), Maurílio (piston), Jorginho (flauta), As Gatas e Cristina Buarque (coro).

As faixas do LP


As faixas, todas com arranjo de José Briamonte. Composições de Adoniran Barbosa (exceto as indicadas)

Lado A

1) "Fica Mais Um Pouco Amor"

2) "Tiro ao Álvaro" (Adoniran e Oswaldo Molles), com Elis Regina

3) "Bom Dia, Tristeza" (Adoniran e Vinícius de Moraes), com Roberto Ribeiro

4) "O Casamento do Moacir" (Molles e Adoniran), com Talismã e Seu Conjunto

5) "Viaduto Santa Efigênia" (Adoniran e Alocin), com Carlinhos Vergueiro

6) "Aguenta a Mão, João" (Adoniran e Hervé Cordovil), com Djavan

7) "Acende o Candieiro", com Nosso Samba

Lado B

1) "Apaga o Fogo, Mané"

2) "Prova de Carinho" (Adoniran e Cordovil), com Vania Carvalho

3) "Vila Esperança" (Adoniran e Marcos Cesar), com MPB4

4) "Iracema", com Clara Nunes

5) "No Morro do Piolho" (Peteleco, Jacob de Brito e Carlos Silva)

6) "Despejo na Favela", com Gonzaguinha

7) "Torresmo à Milanesa" (Adoniran e Carlinhos Vergueiro), com Clementina de Jesus e Carlinhos Vergueiro

E você? Já conhece esse LP? Deixe nos comentários sua faixa favorita ou uma memória com Adoniran.

Ouça no Spotfy:

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