O Barquinho Cultural

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quarta-feira, 24 de setembro de 2025

Morre Claudia Cardinale, uma da últimas divas italianas


A atriz Claudia Cardinale morreu nesta terça-feira (23/09/2025), aos 87 anos, perto de Paris. Nascida em 1938 na Tunísia, de família italiana, sua primeira língua foi o francês. Ela entrou para o cinema após vencer, aos 17 anos, um concurso de beleza em Túnis, mesmo sem interesse inicial em atuar.

Sua carreira deslanchou no fim dos anos 1950 e 1960, quando estrelou alguns dos filmes mais importantes do cinema europeu, entre eles "Oito e Meio" (Fellini), "O Leopardo" (Visconti) e "Era uma Vez no Oeste" (Leone). Também participou de produções internacionais como "A Pantera Cor-de-Rosa", de Blake Edwards (1963).

Aos 22 anos, filmou "Rocco e Seus Irmãos" (1960) com Luchino Visconti, que um ano depois lhe deu um de seus papéis mais emblemáticos, o de Angelica em "O Leopardo", ao lado de Alain Delon e Burt Lancaster, em 1963.

Frequentemente comparada a Brigitte Bardot, a morena “CC” e a loira “BB” trabalharam juntas em um filme, "As Petroleiras" (1971).

Em entrevistas, Cardinale contou que sua entrada no cinema foi motivada pela necessidade de sustentar o filho, Patrick, fruto de uma gravidez precoce em circunstâncias difíceis (estupro).

Ao longo de mais de 60 anos de carreira, trabalhou em mais de cem filmes e recebeu prêmios e homenagens, incluindo o Leão de Ouro honorário do Festival de Veneza em 2002.

Claudia Cardinale é lembrada como uma das grandes atrizes do cinema europeu do século 20, reconhecida por sua contribuição à história do cinema.

“Era bela, simples, sem história, mas quando a câmera gravava, ela se iluminava com um sorriso e um olhar carinhoso que destacava sua voz rouca. Os grandes a magnificaram, ela os serviu e nós, nós amávamos ternamente essa pessoa delicada”, comentou à AFP Gilles Jacob, ex-presidente do Festival de Cannes.

(Fontes: EW, Carta Capital)




domingo, 14 de setembro de 2025

Tenório Jr. volta...

Foto: Amberes Revista Cultural

Durante quase 50 anos a família do músico Tenório Jr. deve ter sofrido muito ao ouvir essa canção de Lupicínio Rodrigues, na voz de Gal Costa, do disco "Índia", de 1973, no qual
ele a acompanha ao órgão. Conforme reportagem de Eduardo Reina e Vitor Nuzzi no "Estadão" deste sábado, 12/09/25, foi identificado seu corpo, desaparecido desde março de 1976 durante uma turnê com Vinícius e Toquinho em Buenos Aires.

Morto com 5 tiros, provavelmente confundido com algum inimigo do regime militar que se instalaria no país dias depois, a Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF) finalmente o identificou. Ele havia sido sepultado com não identificado em um cemitério local.

Francisco Tenório Cerqueira Júnior, conhecido como Tenório Júnior, nasceu em 4 de julho de 1941 no Rio de Janeiro e cresceu no bairro de Laranjeiras. Pianista talentoso, destacou-se no gênero samba-jazz, estilo de música instrumental brasileira dos anos 1960. Admirador de Bill Evans e Horace Silver, era presença constante nos clubes do Beco das Garrafas, em Copacabana.

Seu único álbum como líder foi "Embalo" (RGE, 1964), gravado enquanto cursava Medicina, com participações de grandes nomes como Paulo Moura, Raul de Souza, Milton Banana e Rubens Bassini. O disco inclui faixas marcantes como "Nebulosa", "Samadhi" - ambas dele - e "Consolação" (Baden Powell e Vinícius de Moraes), revelando seu talento precoce aos 23 anos.

Tenório também colaborou em álbuns de artistas como Edison Machado ('É samba novo'), Wanda Sá ('Vagamante'), além de ter seu nome presente em gravações de Milton Nascimento, Edu Lobo, entre outros.

A esposa, Carmen Cerqueira Magalhães, e dois de seus cinco filhos não estão mais aqui para receber a notícia.

Volta (Lupicínio Rodrigues)
Quantas noites não durmo
A rolar-me na cama
A sentir tantas coisas
Que a gente não pode explicar quando ama

O calor das cobertas
Não me aquece direito
Não há nada no mundo
Que possa afastar esse frio do meu peito

Volta
Vem viver outra vez ao meu lado
Não consigo dormir sem teu braço
Pois meu corpo está acostumado

sábado, 13 de setembro de 2025

Os muitos Hermetos Pascoais

Foto: Mônica Imbuzeiro / Agência O Globo


Inconformado que Hermeto Pascoal tenha morrido! Estava programado o alarme para comprar o ingresso para a próxima apresentação dele no Sesc... Do disco em homenagem à sua companheira, Ilza, show este que perdi as outras datas por razões diversas. Hermeto morreu neste sábado, 13/09/25, aos 89 anos, no Rio de Janeiro.

Eu o vi no palco há muitos anos, num circo no Anhembi, ou sei lá onde... faz tempo. O que não esqueci é que o show acabou e ele convidou a plateia a sair da tenda e continuar o show na calçada, na rua. Inspirado em sua incrível habilidade em extrair sons de qualquer objeto, comecei a batucar o sabugo da espiga de milho cozido recém debuvorada.

Nunca me esqueço de sua apresentação no Festival Abertura, da TV Globo, em 1975, tocando "O Porco na Festa", laureada como melhor arranjo no certame.

Em 1983, comprei meu primeiro LP dele, "Hermeto Pascoal & Grupo", pela Editora e Produtora Fonográfica Som da Gente, no qual o time é para deixar qualquer Ancelotti babando: Heraldo do Monte, Carlos Malta, Jovino Santos, Itiberê Zwarg, Márcio Bahia, Pernambuco...

"O músico é um cara mágico, com energia diferente, que se comunica com as pessoas através da música. Quando ele consegue passar essa energia, e da mesma forma receber, ele consegue o maior êxito." Está escrito lá na contracapa do disco. Não sei se foi Hermeto quem escreveu, mas é algo que entendo que ele sentia.

Mais recentemente, comprei o CD "Zabumbê-bum-á", disco de 1979 relançado pela Livraria Cultura, em 2011, sob licença da Warner. No disco, Hermeto é acompanhado por Nenê, Itiberê, Zabelê, Cacau, Jovino, Pernambuco, seu pai, Pascoal José da Costa, e sua mãe, Divina Eulália de Oliveira, além de Antonio Celso, Alexandre, Marcelo, Paulo, Cecília e Ruy.

1979 foi também o ano em que Hermeto recebeu o título de "um dos maiores músicos do mundo ", durante sua apresentação no Festival de Jazz de Montreux, Suíça. Apresentação esta em que toca com Elis Regina três músicas ("Asa branca", "Corcovado" e "Garota de Ipanema") em que o público vem abaixo...

Hermeto era múltiplo. Não porque tocava múltiplos intrumentos e não-instrumentos. Ou porque transitava em quaisquer vertentes musicais. Era múltiplo porque não tinha fronteiras, nem amarras, nem arreios. Era livre, e por ser livre não cabia em nenhuma classificação, em nenhum escaninho. Em nenhum padrão. Era Hermeto!

Não vai dar para vê-lo no Sesc nem agora, nem nunca mais.

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Só nos resta... Angela RoRo


Foto: Bob Wolfenson

A cantora, compositora e pianista Angela RoRo morreu nesta segunda-feira, 8 de setembro de 2025, aos 75 anos.

Há poucos dias, vi uma postagem dela numa rede social, pedindo doações para seu tratamento. Diz o noticiário que ele teve uma infecção pulmonar e seu apelo é porque não dispunha de recursos para se tratar.

Não sei o quanto isso é verdade. O que sei é que uma artista de sua importância e talento não deveria passar necessidade. Será que nenhum dos seus admiradores poderia fazer algo?

RoRo apareceu pela primeira vez tocando gaita em uma das faixas do álbum "Transa", de Caetano Veloso, lançado em 1972, quando de seu exílio em Londres. A música é "Nostalgia (That's What Rock'n Roll Is All About)".

Caetano compôs para ela "Escândalo", que dá título a seu terceiro álbum, de 1981. Mas seu primeiro LP, homônimo, veio à luz dois anos antes, com 12 composições de sua autoria.

A que ganhou repercussão foi "Amor, Meu Grande Amor", dela e Ana Terra, que está na trilha da novela da Globo "Água Viva", de Gilberto Braga, e "Caminho das Índias", de Glória Perez, mas é um disco repleto de ótimas canções, como "Cheirando A Amor", "Tola Foi Você", "Balada da Arrasada", "Abre o Coração".

Aliás, não faltaram canções em sua voz a entrarem em trilhas de novelas da TV Globo... Busque saber.

Ano seguinte, vem com "Só Nos Resta Viver". O LP tem sua interpretação visceral para "Bárbara", de Chico Buarque e Ruy Guerra, da peça "Calabar - O Elogio da Traição", e "Fica Comigo Esta Noite", de Adelino Moreira e Nelson Gonçalves, ambas acompanhadas ao bandoneón por Ubirajara Silva.

O LP tem ainda duas faixas que são sua própria essência (além das composições que falam de amores vêm, amores vão): "Meu Mal é a Birita" e "Tango da Bronquite" (também com o bandoneón de Bira, claro).

O disco de 1981, "Escândalo", traz também "Tão Beata, Tão à Toa", de Guto Graça Mello e Naila Skorpio, que, em versão roqueira de Marina Lima, entrou no tema de abertura da novela "Corpo a Corpo", de Gilberto Braga, na Globo. "Vou Lá No Fundo", de Naila Skorpio e Sônia Burnier, é outra de minhas lembranças da artista.

"Simples Carinho", de 1982, abre com a faixa-título, composta pelos mestres Abel Silva e João Donato. Tem ainda uma de Tom Jobim e Aloysio de Oliveira, "Demais" -que parece ter feito sob medida para ela (Todos acham que eu falo demais / E que eu ando bebendo demais / Que essa vida agitada / Não serve pra nada / Andar por aí / Bar em bar, bar em bar...). Vai que, né?

Em "A Vida é Mesmo... Assim", de 1984, ela aparece cândida na capa, com um véu rosa, e apresenta "Fogueira", baita canção que ganhara antes interpretação igualmente intensa de Maria Bethânia em seu álbum "Ciclo", de 1983.

"Eu Desatino" é seu trabalho de 1985, que teve a primeira faixa, "Blue Janis", proibida à execução pública (talvez por se referir à heroína ou à liberdade sexual em seus versos cortantes).

"Prova de Amor", de 1988, traz composições de Bernardo Vilhena e Lobão ('Sempre Uma Dose A Mais'), Tavinho Paes e Arnaldo Brandão ('How Green Was Your Monkey') e outras dez dela - duas em parceria, "Viciado em Regras", com Aleph D. Clic, e "Funk do Negão", com Ari Mendes.

Em 2000, lança "Acertei no Milênio", uma brincadeira com "Acertei no Milhar", samba de Wilson Baptista e Geraldo Pereira gravado em 1940 por Moreira da Silva. Neste CD grava dois standards norte-americanos, "All Of Me", de Seymour Simons e Gerald Marks, e "Don't Let Me Be Misundertood", de Bennie Benjamin, Horace Ott e Sol Marcus. Neste disco RoRo dá sua interpretação para "Gota D'Água", de Chico Buarque.

Em 2006 lança "Compasso", cuja canção título, dela e de Ricardo Mac Cord, é quase um epitáfio: "Vou carregar de tudo vida afora / Marcas de amor, de luto e espora / Deixo alegria e dor / Ao ir embora".

"Selvagem", de 2017, foi seu último disco com canções inéditas, gravado em casa, na realidade no lar de seu tecladista e parceiro Mac Cord. O disco traz repertório variado, que vai do baião ('Parte Com o Capeta'), ao constante blues ('Portal do Amor'), passando pelo samba ('De Todas as Cores' e 'Maria da Penha').

Entre esses últimos, ela lançou dois álbuns com canções consagradas, "Angela RoRo Ao Vivo", de 2006, e "Feliz da Vida"", em 2013. Houve ainda o primeiro ao vivo, "Nosso Amor Ao Armagedon", de 1993, vários singles e compilações.

Vida

Nascida Angela Maria Diniz Gonçalves em 5 de dezembro de 1949, no Rio de Janeiro, ela foi uma das maiores vozes da música brasileira, conhecida por sua voz rouca, letras confessionais e uma presença de palco única.

O interesse pela música começou cedo. Aos 5 anos, já estudava piano clássico e, um ano depois, compunha em seu acordeão. O apelido "RoRo" surgiu na adolescência, por causa da sua voz grave e rouca, uma marca registrada que a acompanharia por toda a carreira.

No início dos anos 1970, Angela RoRo se mudou para Londres, onde trabalhou como faxineira, garçonete e lavadora de pratos. Paralelamente, ela se apresentava em pubs, tocando piano e cantando. Foi nesse período que teve contato com o cineasta Glauber Rocha, que estava em exílio, e chegou a ser convidada pelo empresário Malcolm McLaren (futuro mentor dos Sex Pistols) para gravar um álbum de blues, projeto que não se concretizou.

Ao retornar ao Brasil, Angela RoRo se firmou como uma das figuras mais originais da MPB. Sua autenticidade e a forma como falava abertamente sobre sua sexualidade a tornaram um ícone, especialmente na comunidade LGBTQIAPN+.

Ao longo de sua carreira, Angela RoRo lançou diversos álbuns e teve suas músicas gravadas por grandes nomes da música brasileira, como Maria Bethânia, Ney Matogrosso e Marina Lima. Uma curiosidade é que a famosa canção "Malandragem", composta por Cazuza, foi oferecida a ela, mas RoRo recusou-se a gravá-la por não gostar da letra, e a música acabou sendo imortalizada na voz de Cássia Eller anos depois.

RoRo, que foi eleita pela revista "Rolling Stone" como a 33ª maior voz da música brasileira, continuou ativa até seus últimos anos, se apresentando em shows e participando de programas de TV, sempre com sua personalidade forte e seu talento inquestionável. Ela deixou um legado de coragem, talento e autenticidade. (Fontes: Discos do Brasil, Discogs, O Globo, G1, Biscoito Fino e Gemini)


terça-feira, 2 de setembro de 2025

Scrut celebra 50 anos de álbum Zappiano icônico

Foto e vídeo:Carlos Mercuri


O mês de agosto de 2025 terminou com a celebração de um dos discos mais fodásticos da discografia Zappiana - e, por que não dizer, do rock-pop-jazz mundial: "One Size Fits All". E a homenagem não poderia partir de uma galera mais que qualificada: a Central Scrutinizer Band!

A banda paulistana também tem efeméride a comemorar: em julho, completaram 35 anos de existência, entre formações diversas, mas com o núcleo-base ainda na ativa: Mano Bap (guitarra e voz), Cadu Bap (sax alto e voz), Hugo Hori (sax tenor, soprano, flauta e voz), Eron Guarnieri (teclados e voz), Ricardo Bologna (percussão), Caio Góes (baixo) e Claudio Tchernev (bateria).

A banda levou à Cervejaria Tarantino, na zona norte (pertinho de casa), a íntegra do álbum do Frank Zappa & The Mothers of Invention lançado em junho de 1975 que, simplesmente, redefine a obra dos artistas e marca em mármore o nome da banda no pedestal dos grandes da cultura pop mundial.

Não digo que "One Size Fits All" seja meu álbum preferido do Zappa... Eu ouvi TODOS seus 58 LPs oficiais - de "Freak Out (1966) a Yellow Shark (1993) - e este, se não é meu preferido, pelo menos é o que ouço com mais frequência.

Por quê? Não sei... Há uma pulsação nele que me remete a uma camada primitiva de meu ser, algo incompreensível, mais intuitivo, sensorial que intelectual, racional...

A banda Central Scrutinizer, da qual vários de seus integrantes militaram em outras paragens, tipo Karnak e Funk Como Le Gusta, é considerada - até pelo próprio Zappa - uma das melhores a celebrarem o repertório do gênio de Baltimore.

Esta apresentação mostrou o tamanho deles e da obra que resolveram homenagear. "One Size Fits All" é um disco que foi sendo melhor compreendido com o tempo. Em seu lançamento, 50 anos atrás, a imprensa especializada não foi unânime: o álbum foi recebido com certa cautela por alguns críticos.

Com o tempo, a crítica - e os ouvintes - foram percebendo o quanto de inovador e revolucionário o trabalho é. E os conceitos se foram apurando. Até que hoje é inegável se tratar de uma obra-prima.

O disco é visto hoje como o ápice da fase "jazz-fusion" de Zappa e de sua colaboração com a segunda formação da banda The Mothers of Invention, que muitos fãs consideram a mais icônica. A virtuosidade dos músicos, especialmente de George Duke (teclados), Ruth Underwood (vibrafone e marimba) e Chester Thompson (bateria), é um dos pontos mais elogiados.

"One Size Fits All" também é notável por ser o primeiro álbum de Zappa a ser gravado inteiramente em uma mesa de 24 canais, o que permitiu uma qualidade de som e uma densidade de arranjos sem precedentes em sua discografia até então.

Mas não é preciso entender dessas minúcias técnicas ou estilísticas para apreciar esses quase 44 minutos de puro deleite. Os quais a banda CS reproduz com maestria e uma dose correta de improviso e releitura.

Que 2026 os traga firmes para repetir a dose nos 60 anos de estreia de Zappa & Mothers reproduzindo o igualmente seminal "Freak Out".

Music is the best!