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Cantora, compositora, ilustradora, estilista: Mariana usa todos esses recursos em seu trabalho (foto: Carlos Mercuri) |
Mariana Degani diz que aprendeu a cantar com Adoniran Barbosa e Cartola, antes mesmo de
começar a cantar. A paulistana de Vila Madalena primeiro foi estudar moda,
formou-se estilista, mexendo com o vestir. O pano se torna uma das superfícies
para seu outro talento, o de ilustradora. Com a parceira de faculdade
Verônica Alves, abecediana de Mauá, atualmente
radicada em Curitiba, são as
Pupillas, duo de
ilustradoras que pinta telas, muros, caixas d’água, objetos, peles...
O cantar surge em rodas de samba pela noite, com os amigos,
um impulso vindo de dentro, do ouvir nosso som primordial nas vozes de nossos
compositores e intérpretes fundamentais. Não deu outra. Lá estava ela à frente
de uma banda de oito, o
Loungetude46,
nome que remete à longitude de São Paulo na carta geográfica, assumindo os
vocais. Dois discos, turnês pela Europa, e a ideia, a necessidade de partir
para um trabalho solo. Na verdade um duo, com o companheiro
Remi Chatain,
músico da
Trupe Chá de Boldo.
O projeto solo/duo vem com a junção de todas as habilidades
dela e de Remi: música, canto, imagens, roupas, cenário... As canções têm um
clima intimista, o cantar vem de uma voz suave, aveludada, as letras falam de
sensações, observações do cotidiano, de lugares, de fatos... Melhor ela mesmo
explicar: “Ilustrar aumenta o mundo” (Verônica Alves e Mariana Degani):
Escrevo,
pra deixar desviar
dos ombros meus
O viver peso-pesado
ao qual
Eu me destino e
invisto
Caso contrário, me
ferindo bem fininho
E como mão
adormecida eu peso
Ilustro pra saber
que quando ardo
Algo vai pra luz
Resfrio, sorrio,
curo.
Ela e Remi agora estão produzindo o resultado dessa
parceria, o disco “Furtacor”, que deve ficar pronto no começo do ano que vem. Enquanto
isso, alguns clipes podem ser vistos/apreciados/degustados. Estão no
Youtube:
“Canto às vadias”é resultado da
compreensão de
Thiago Bandeira,
após insistentes tentativas de Mariana, das Marchas das Vadias.
“Ser Tão” veio da viagem dela e de Remi ao Nordeste.
Captaram imagens em Canudos, de onde a paisagem desértica remeteu a Fernando
Pessoa (Tudo quanto penso/Tudo quanto
sou/É um deserto imenso/Onde nem eu estou). A canção veio depois:
Na entrevista concedida em 6 de novembro de 2014, em seu
aprazível apartamento em São Paulo, ao blog, Mariana fala de suas origens,
inquietações, de política, feminismo, jornadas de junho, viagens e projetos:
Blog por Bloga: Como
você se percebeu gostando de música, de cantar, de criar, além da questão da
abstração, da questão do visual?
Mariana Degani: Bom,
eu gostava já do cantar, então pra mim foi muito prazeroso. Eu não tive uma
educação... No Loungetude, por exemplo, todos os músicos são músicos desde sempre,
e eu era... tipo: ‘cheguei agora, vamos lá’, comecei a cantar. Aí é que eu fui
buscar um respaldo e fui fazer aula de canto e aí outras coisas. O prazer pelo
cantar sempre existiu. Com o Remi, que é produtor musical, a gente começou a
fazer umas coisas de produção, de gravar no estúdio. Coisa que aí até saía, mas
eu ficava supernervosa...
Bloga: Coisas de
vocês...
Mariana: É,
trilha... É legal que, assim, a Verônica, que é a outra Pupilla, a gente foi
amiga na faculdade, mas nem tanto, e no último ano foi que a gente ficou mais
amiga e, embora a gente não tenha feito muitos trabalhos junto, a trilha sonora
do desfile dela foi o Remi que fez e eu gravei “Eu sou neguinha”, do Caetano, a
gente fez uma viagem, sem marcação de tempo, coisa louca, e foi uma coisa que
eu adorei fazer, era uma música que eu gostava, e a gente transformou-a numa
outra coisa e isso virou a trilha do desfile da Vero. Foi quando eu comecei a
pensar nisso. E foi muito do Remi assim, também, que foi indo, vamos lá, e aí a
gente decidiu formar o Loungetude46... Foi legal.
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Vocalista no Loungetude46 (foto: Facebook) |
Isso já me colocou na frente
do Loungetude, como essa frontwoman, porque eu não toco nenhum instrumento. Foi
muito legal... No início pra mim foi uma coisa muito doida, porque o palco era
algo que me... Sou tímida, supertímida, eu chegava no começo e era um negócio
meio forte pra mim. Eu sou aquela que, antes do show você vai me encontrar
pendurada, montando, carregando luz, não sei o quê, no último momento é que eu
vou, me troco rapidinho, faço maquiagem, uma massagem aqui...
Eu adoro produção,
pra mim isso já é parte. E aí o cantar era o final de tudo isso, que tinha uma
coisa muito legal, mas no início era meio dolorido. Aí foi muito bom porque o
tempo foi passando, a primeira turnê que a gente fez foi pela França, foi
quando eu ultrapassei a arrebentação. Tem um vício meu: eu fico às vezes um
tempo sem fazer show e vou no show das pessoas e fico querendo estar lá...
Bloga: E como é que
pintou esse negócio de Europa, de França?
Mariana: O pai do
Remi é francês, então a gente tem essa relação com a França, de amigos,
músicos, essa coisa de vez em quando visitar o pai, vó e tal. A gente começou a
fazer, sempre foi um trabalho independente, de formiguinha mesmo, entrar em
sites, procurar, fazer listas, juntar nomes, lugar, prefeituras, não sei o quê,
e fazer esse trabalho, mandar e-mail, tentar fechar show. E dessa forma a gente
fez. Na primeira turnê a gente passou dois meses, fez 25 shows...
Bloga: Na França?
Mariana: Na
França, em Londres...
Bloga: Isso foi em...
Mariana: 2011. Em
2012 a gente foi de novo e ficou só um mês, na verdade 20 dias, e fez 12 shows.
É uma coisa que rola, mas que também rola porque a gente batalha. [
Leia aqui texto dela sobre a turnê europeia
com o Loungetude46]
Bloga: E como é que
foi a receptividade?
Mariana: Demais.
O povo francês adora o Brasil e eles conhecem muito a música brasileira. Muitas
vezes eles estão acostumados a ouvir essa música brasileira de exportação, o
“Garota de Ipanema” [Vinícius de Moraes e Tom Jobim] e eles são muito
curiosos pra novidades. Estão muito acostumados a ouvir “
Garota de Ipanema”, um
monte de banda faz isso lá, então para coisas novas o francês é muito curioso, muito
respeitoso. A diferença lá... É engraçado: aqui a gente vê uma banda tocando e
o silêncio lá é muito maior do que aqui.
A gente tem alguns lugares, como a
Casa de Francisca,
que a hora que começa o show o bar para de atender e a gente só assiste à
música. Muitas vezes têm shows, mesmo no
Mundo Pensante,
um lugar superlegal, onde tem shows, muitas vezes a pista, as pessoas dançando,
mas já teve a
Ná Ozzetti, a família Ozzetti lá
tocando e a galera conversando. Foi até um momento muito bonito que aconteceu
lá, que teve a intervenção do Remi, que trabalhava lá na época e falou,
interveio: ‘A gente está recebendo aqui nada menos que a Família Ozzetti. Eu
queria pedir pra quem estivesse a fim de bater papo que vá lá fora; quem quiser
ficar aqui dentro, respeito’. E aí foi um momento de as pessoas chorarem e depois
ficou silêncio até o fim da noite.
É um negócio que as pessoas nem fazem de
propósito, não que elas estejam pouco se fodendo, é uma outra forma de enxergar
a cultura. Então é muito legal lá, o retorno é muito bom. Este ano eu estive lá
de novo, fomos no meio do ano.
Esse projeto solo a gente lançou em abril, e fez um show no
Mundo Pensante, estava cheio. Depois a gente não fez mais aqui e em junho fomos
para a França e fez uma turnê, passamos dois meses lá, fizemos uns 14 shows.
Pra mim é meio que um ideal desse novo show. Eu tenho projeção, tem cenário,
então eu levo tudo o que falo que é meu cirquinho, essa mala aqui, que são os
tecidos, os figurinos, tem o projetor...
Bloga: Os figurinos é
você também que faz, e as ilustrações, toda a parte de produção musical?
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Remi no Estúdio Sofá Vertical (foto: Carlos Mercuri) |
Mariana: Sim... A
gente produz os vídeos, é algo que a gente faz em dupla, trabalha muito junto,
todos os processos. Mesmo minhas músicas, eu componho muita coisa, jogo na mão
dele. A gente vai trabalhando junto, tem aqui o estúdio, a gente trabalha muito
aqui. Essa ideia de que o trabalho é a dois, a gente viaja e está trabalhando.
Esse clipe do “Ser Tão” [Mariana Degani e Fernando Pessoa] que a gente lançou
esta semana, a gente fez uma viagem no ano passado pelo Piauí. Fomos até
Teresina e alugou um carro e de Teresina a gente foi até Pernambuco, Bahia e
voltou. Foi muito legal. E a gente estava lá, olhando para aquela paisagem e resolvemos
fazer o vídeo. A gente queria fazer um clipe, mas não tem música, então
decidimos fazer um clipe e depois fazer a música. Então muita coisa surge
desses processos.
Bloga: Mais assim você
perceber o que está ao redor e aí vai saindo. Agora, você está falando de suas
inquietações, como você vê o mundo... O que você pensa desse mundo, como é que
você se vê nesse universo conturbado?
Mariana: A gente
está vivendo, sempre viveu momentos conturbados. Tem momentos em que as coisas
estão mais inflamadas. E hoje a gente tem muita coisa pra se chocar, se
desesperar, está o Datena [José Luiz
Datena, apresentador do ‘Brasil Urgente’, da TV Bandeirantes, de São Paulo,
programa que traz reportagens sobre crime e violência] a tarde inteira
falando na TV e a gente não vê, por exemplo, um programa falando dos caras que
estão fazendo coisas incríveis pelo mundo, pequenas revoluções, esse tipo de
coisa a gente não sabe. No Facebook de vez em quando você vê uma imagem de um
cara X, mas a gente é muito mais estimulada por esse lado catastrófico da
violência...
Bloga: Que é uma coisa
que a grande mídia quer levar, mas há outras alternativas...
Mariana: Sim, e
eu acredito que, como artista, seja visual, música... Primeiro que eu não
separo artista e obra, não consigo me separar, a arte é tão consequência do que
se é... Acredito muito na importância do artista como porta-voz seja lá para o
que ele achar. Hoje a gente tem o Lobão [
João
Luiz Woerdenbag Filho, cantor, compositor, escritor; disse que sairia do Brasil
se a presidenta Dilma Rousseff fosse reeleita; não saiu], um artista
defendendo seus ideais. Enfim, acredito na importância disso, sim. Mas,
sobretudo, eu vejo que o meu trabalho, tanto musical quanto visual, penso nele
como um processo de cura...
Não é nem falar sobre o amor, sobre o bem, mas
propor questionamentos e fazer as pessoas pensarem que existem, sim, muitas
outras formas de fazer tudo nesse mundo. E é engraçado porque, ultimamente, eu
me posiciono politicamente, e faz muito tempo que eu não quebro pau com
ninguém. Esse junho do ano passado me fez muito mal. Ficava lá brigando com as
pessoas, umas lá falando umas coisas absurdas, culpando o cara que está cego
porque tomou uma bala no olho. Hoje em dia eu busco mais esse diálogo, e de vez
em quando você vai dialogar com gente que acha que são mais importantes os
juros e o dólar do que a quantidade de pessoas que comem no país. A gente vai o
tempo inteiro lidar com isso. Eu busco esse processo de microrrevolução, que
acredito que essas são as verdadeiras revoluções que estão acontecendo e as
pessoas estão fazendo nas suas casas, independente do candidato delas pra
presidente.
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Tranquila, mas revoltada: microrrevoluções (foto: Carlos Mercuri) |
Bloga: Esse momento
foi bastante polarizado, houve até radicalizações de parte a parte, mas acho
que há um caminho no meio que não precisa se exaltar. Afinal, o que a gente busca
né?
Mariana: Sim,
exatamente...
Bloga: Acho que a
política, o processo eleitoral, é um meio, mas não é o fim. E você vê a arte
por aí também, como uma maneira de você dizer alguma coisa. Porque você parecer
ser uma pessoa bastante tranquila...
Mariana: É meio
isso. Eu sou supertranquila, mas sou super-revoltada também com um monte de
coisa, entendeu?
Bloga: O que lhe
revolta?
Mariana: Tantas
coisas... As questões sociais, as questões da mulher. De gênero...
Bloga: Como você vê
essa questão de gênero? Apesar de não ter sido, tirando a Luciana Genro [candidata
a presidente da República nas eleições de 2014 pelo Partido Socialismo e
Liberdade – PSOL, teve 1.612.186 votos, ficando em quarto lugar na disputa]
que trouxe a questão, mas a questão passou
um pouco (batida no debate eleitoral este ano)...
Mariana: Eu
acredito nisso: viva sua vida e deixe-me viver. Se você é contra dar o cu, não
dê o cu; se é contra o aborto, não aborte; se é contra o casamento gay, não
case com um homem. Pra mim é simples assim o mundo...
Bloga: Viva e deixe
viver...
Mariana: Sim. As
coisas que me revoltam são essas. Você vê muita gente revoltada, mas a vida
dela está boa, mas ela está lá dentro de uma passeata contra o casamento gay,
entendeu? Não vai mudar em nada a vida dela. Seja contra isso, seja contra o
Bolsa Família. Tem também as pessoas que estão comendo bem, viajando uma, duas
vezes por ano fora do Brasil, com seus carros importados sempre novos e que
acham um absurdo as pessoas que estão vivendo do Bolsa Família. Elas falam que
hoje em dia está difícil arrumar um porteiro que queira trabalhar porque ele é
vagabundo e recebe o Bolsa Família. Então, seu salário está baixo, porque o
Bolsa Família também não garante quase nada, então repensa aí seu salário, se
ele não está querendo trabalhar...
Bloga: Você andou aí
pelo sertão, já conhecia essa parte do Brasil?
Mariana: Não
conhecia.
Bloga: Foram de carro?
Mariana: A gente
foi de avião até Teresina e lá alugamos um carro, e foi legal, fizemos 2.500
quilômetros, que a gente desceu e depois subiu de novo.
Bloga: Chegou a
navegar pelo São Francisco? Pegou aquelas gaiolas?
Mariana: Não, na
verdade a gente nadou. Inicialmente nossa viagem era para São Raimundo Nonato,
na
Serra da Capivara,
queria ir onde tem aquelas pinturas rupestres, ia ficar uns dias ali, e foi
muito doido, porque foi chegando um momento em que eu comecei a ter uma
necessidade de água; fomos descendo... Não sei se foi no primeiro ou segundo
dia; acho que no primeiro dia a gente fez a viagem até São Raimundo Nonato. Estava
meio sem pressa, a gente gosta muito de viajar assim, até dou uma olhada, vejo
os lugares, mas a gente não gosta de fazer planejamento. Eu amo o acaso, adoro
decidir as coisas na hora, adoro não ter reserva. Chegar e dizer: ‘eu gosto
desse hotel’.
Então no meio disso a gente mudou o trajeto e chegou uma hora em
que eu falei ‘eu preciso ir pra praia’, porque naquele São Raimundo Nonato você
anda... Sabe quando você faz trilha? Eu já fui, por exemplo, para a
Chapada dosVeadeiros.
Você faz uma trilha de cinco horas e chega numa cachoeira maravilhosa e no
Piauí isso nunca acontece, chega num lugar e... nada. Aí chegou uma hora que eu
falei ‘vamos para o rio’, e aí a gente decidiu ir para o rio São Francisco e
fomos para Petrolina, e ficou por ali, Petrolina, Juazeiro. Foi uma viagem
curta, na verdade, passamos oito, dez dias no máximo. E teve esse dia que a
gente tirou para ir até
Canudos
para fazer essa viagem...
Bloga: Então quer
dizer que está seco e revelou a comunidade...
Mariana: A
Canudos original foi inundada em 1960 para virar uma represa, então mudaram
Canudos, que ainda existe, só que falaram: ‘agora é aqui’. Não tem nada, é um
lugar que é muito louco, porque é um parque estadual, você paga quatro reais
para entrar, pode até chamar um guia pra ir junto, mas não tem por que, eles te
dão um mapinha, mas não tem onde se perder, porque é uma coisa desértica, são
morros desérticos, tem alguns momentos que você chega aos lugares onde
aconteceu alguma coisa, mas é no meio do nada, não tem ninguém e a gente ficou
perdida no meio do deserto.
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O Brasil está em obras (foto: Carlos Mercuri) |
Bloga: Mas tem toda
uma sensação que você recebe...
Mariana: É
maravilhoso, porque você sente a história ali...
Bloga: É muito
interessante porque, quando eu fui fazer essa viagem, quando me casei, e
pegamos aquela gaiola a lenha, e ela vai parando nas cidades, e vira atração na
cidade... Quando a gaiola chega, vem toda a comunidade dentro dela, os caras
vêm lá tocar forró, vender coisas, é muito interessante. Aquelas comunidades
distantes, aquele pessoal carente, mas é uma alegria, felicidade...
Mariana: É muito
legal, a gente deu carona pra pessoas, elas têm o hábito de pedir carona na
estrada. O dia que a gente foi pra Canudos, 250 quilômetros para ir, mais 250
pra voltar... E muitas vezes em estradinhas, que são maravilhosas, as estradas
no Piauí... A gente não pegou um pedágio nem um buraco. Pelo menos a hora que
você vira à Bahia aí é um negócio que você não acredita, está bem detonado. Mas
no Piauí foi muito surpreendente isso. De fato aqui no Sudeste, como classe
média, em São Paulo, você não consegue ter uma visão tão clara das coisas mudando.
Mas no Piauí foi muito legal fazer essa viagem de carro porque a gente anda nos
lugares mais no meio do nada e via um monte de cisternas... [
Clique aqui para saber mais sobre o programa ‘Água para
Todos’].
O Brasil está em obras, aquele lugar
ali está em obras. Mesmo essa cidade, São Raimundo Nonato, de cinco anos pra
cá, aumentou em 60% a quantidade de casas que existiam na cidade. As pessoas
agora saíram da casa da mãe e construíram a casa do lado. Você percebe esse
trabalho que é de formiga, que é mudar uma sociedade, como eu disse, eu acredito
em microrrevoluções, porque não adianta chegar a Dilma ou o Aécio ou a madre
Tereza de Calcutá porque não vai fazer assim e tudo vai se resolver... Mudar
uma sociedade... É claro que todos eles poderiam fazer muito melhor do que já fazem,
mas...
Bloga: Tem que ter
também o próprio cidadão...
Mariana: É,
existe um tempo que é necessário. Mesmo essas questões LGBT... Eu sou muito
otimista em relação a isso quando eu vejo essas gerações, essa molecada de 20
anos hoje em dia, que, pra eles, nem é mais uma questão. Então acho que a coisa
se transforma... Todo mundo tem um amigo que é gay e adora o amigo que é gay, a
amiga que é lésbica. Você vê essas gerações mais novas e é muito legal perceber
isso. Claro que, como tudo, têm as melhoras, as pioras...
Bloga: Só que tem
gente querendo o retrocesso, que voltem ao militares no poder...
Mariana: É, você
vê uma galera de 20 anos gritando loucamente isso. Eu achei ótimo que eu vi uma
moça na manifestação pelo impeachment da Dilma que na mesma cartolina ela
escreveu ‘intervenção militar’ e ‘liberdade de imprensa’. Achei ótimo, uma
pessoa...
Bloga:
...esclarecida...
Mariana: Ela não
sabe o que está falando. Eu não sou petista, já acreditei muito mais no PT do
que acredito hoje... Podemos falar um monte de coisas, de vários problemas do
PT. Agora, uma coisa que eu não consigo entender muito são as pessoas que
reclamam de falta de liberdade hoje em dia, falam que não têm liberdade, e eu
queria entender pra quê? Porque talvez
elas não tenham liberdade para odiar uma pessoa e para bater numa pessoa; elas
não têm liberdade para semiescravizar um empregado morando na casa dela num
cubículo desse tamanho, né? Que é muito das reclamações que rondam. Muitas
coisas me revoltam, mas eu acredito nas microrrevoluções. Meu trabalho tem a
ver com dialogar com isso de várias formas.
Bloga: Falando em
trabalho, como é que está o “Furtacor”? Como está sendo, o que você está
colocando lá, como está o processo? Gravando? Quando sai?
Mariana: O
“Furtacor” começou de algumas composições que a gente começou a criar no começo
de 2013, quando a gente deu esse tempo no Loungetude e já começamos a pensar em
umas músicas, ‘vamos fazer um projeto’, e o Remi sempre me estimulou muito a
ter esse projeto solo, ele que sempre foi muito da produção, sempre falou das
minhas ilustrações, de criar esse universo que estou criando o tempo inteiro,
que é minha casa, que são todas as coisas que eu faço. E a gente começou a
escolher umas músicas. Com o tempo, do final do ano passado para este ano eu
comecei um trabalho maior, percebi que a gente tinha algumas músicas de uns, de
outros, comecei a sentir necessidade de parar para pensar no que eu estava
querendo dizer com meu trabalho, como essas músicas se relacionam.
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"Furtacor", projeto solo com Remi, sai ano que vem (Foto: Carlos Mercuri) |
Eu acredito
que um disco tem que ter músicas diferentes, mas ao mesmo tempo é uma coisa só,
então, como construir esse todo. E nisso fui sentindo necessidade de compor
outras coisas, outras coisas foram surgindo, a gente foi tirando o que já
tinha. Já começou a gravar esse disco no começo deste ano. Como a gente grava
aqui, a gravação e o processo vão acontecendo meio juntos, chamamos alguns
amigos para participar do disco, embora até então a gente ainda se questionava
sobre esse formato, como a gente funciona nos shows; se a gente ia ter uma
banda, chamar mais um músico, dois, e nisso a gente já estava fazendo o disco.
A gente foi para a França e lá foi interessante porque chegamos à conclusão
que, na verdade, a gente tem que fechar nessa dupla mesmo, nesse formato a
dois, porque é mais viável, cabe dentro de um carro, porque eu quero tocar em
Pindamonhangaba, em Paris e na Bélgica, e sei lá onde mais. A gente começou a
criar novos jeitos de construção da música.
O Loungetude tinha muitos
elementos, vários instrumentos, e a gente começou a pensar nesse trabalho como
ele poderia ser preenchido, mas já sabendo que ele surge de uma concepção mais
minimalista. Eu não toco instrumentos, estou começando agora a me aventurar por
conta desse projeto. Até então não estávamos trabalhado com bateria, agora a
gente está com uma bateria eletrônica, que a gente grava os ciclos e vai
construindo a música ao vivo. Então a gente chegou a essa conclusão que vai ser
mais esse formato a dois e quero sempre ter convidados, porque eu adoro.
A
gente está agora terminando. Entraram duas músicas recentes, ainda tem que
gravar essa parte, mas até o final deste ano eu quero fechar todas as vozes, e
aí a gente vai num estúdio legal para gravar. Até então, aqui, a gente está
gravando tudo que é em linha: guitarra, o pianinho, mas o violão e voz a gente
vai gravar agora em dezembro e a ideia é lançar esse disco no ano que vem.
Bloga: Você pretende
lançar disco mesmo, formato CD? Mas também em outros formatos?
Mariana: Sim, eu
quero lançar na internet, mas eu
adoro pensar nesse grafismo, nesse projeto...
Bloga: É uma coisa que
falta nesse mundo digital; a arte você até pode baixar, mas não é a mesma
coisa...
Mariana: Não é a
mesma coisa.
Bloga: Você gosta de
vinil? Tem ideia de botar em vinil também?
Mariana: Eu adoro
vinil, eu não tenho vitrola, por isso eu acabo não procurando isso, mas acho
que pode ser algo bem interessante, adoro essa ideia, o formato, a sonoridade.
Bloga: Estão
resgatando, muita gente está lançando CD e vinil e iTunes...
Mariana: Pois é,
eu não tenho toca-discos...
Bloga: Mas lá na Santa
Ifigênia você acha... Eu tenho lá, não me desfiz de meus discos, porque muita
coisa não saiu em CD, e acho bárbaro. E shows, como você está, apresentações,
como está de agenda, você tem alguma coisa fechada para a gente já adiantar
para a galera que vai ler?
Mariana: Sim, estou
com dois já confirmados, que são agora no dia 15 de novembro, na Vila Madalena,
na rua Fidalga, tem um espaço de yoga e ayurveda e a gente vai ocupar a garagem
e a calçada e as vagas e eu quero montar o show lá... [ver
aqui]
Bloga: Como chama a
escola?
Mariana: EspaçoSoma.
A gente está terminando de fechar DJ, vai ter DJ, comida, vai ser um evento com
entrada gratuita, e o show. Ainda não fechei, mas em breve vai rolar também
esse show no centro de São Paulo, no Paiçandu e no largo São Francisco. Até
estou indo pra lá depois, tem uma reunião.
Bloga: Será ao ar
livre?
Mariana: São
essas praças, esses decks que estão no centro, da prefeitura, então também
serão abertos, ao ar livre. Meus shows sempre acontecem à noite, porque eu
preciso de escuro. E dia 22 de dezembro vai ter a festa no
Circo no Beco,
não sei se você conhece, na Vila Madalena, o
Beco do Grafite,
ali perto da Inácio Pereira da Rocha, e é um lugar que há anos toda
segunda-feira tem um encontro do circo de rua de São Paulo, é bem conhecido, e
aí tem a rua e aí tem o último encontro deles do ano e eu vou tocar lá, vai ser
aberto também.
Bloga: Mais alguma
coisa que você está planejando em termos de visual? As suas ilustrações você
expõe, tem exposto?
Mariana: A gente
fez uma exposição agora no meio do ano, em junho, a gente fez a turnê e eu fiz
uma exposição em Lyon; a Vero também foi pra França e ficamos numa galeria por
lá. O meu trabalho como ilustradora é superamplo. Daqui a duas semanas estou
indo pra Curitiba fazer um evento, vamos fazer uma pintura na rua. Faço muita
coisa gráfica. A gente voltou dessa exposição na França e está agora buscando
lugares para expor. No começo do ano, em maio, a gente participou de um edital
e pintou uma caixa d’água no Sesi de Mauá. Enfim,
nosso trabalho acaba acontecendo de muitas
formas.
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Com Veronica: pintando caixa d'água |
Bloga: Pupillas é
isso, então, você e a Verônica...
Mariana: Isso,
Pupillas é uma dupla e a gente faz vários tipos de coisas, a gente se define
como ilustradora e acaba fazendo o trabalho em várias áreas porque a gente faz
ilustração de superfícies...
Bloga: Inclusive
pele...
Mariana:
Inclusive pele.
Serviço:
Próximas apresentações de
Mariana Degani e Remi Chatain:
O que: Festa SomAmos: O
evento conta com uma exposição da série fotografias “AUE – Amor, União e
Espiritualidade”, da fotógrafa Débora Frida, e show de Mariana Degani
Onde: Espaço Soma Yoga & Ayurveda - Rua Fidalga, 373, Vila Mariana
Quando - 15 de novembro de
2014, às 19h30 (ou quando o sol se puser totalmente)
Quanto: Grátis
O que: Festa Circo no Beco
Onde: Beco do Grafite – Rua Belmiro Braga, 186, Vila
Madalena
Quando: 22 de dezembro, à noite
Quanto: Grátis