O Barquinho Cultural

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domingo, 23 de abril de 2023

Celso Horta: Um Brasileiro


Presos políticos no Presidio de Barro Branco: Em pé – da esquerda pra direita: Ariston Lucena, Gilberto Beloque, Paulo Vanucchi, Genoino, Mané Cirilo. Sentados: Oséas Duarte, Aton Fon, Reinaldo Mourano, Celso Horta, Hamilton Pereira.


"Quando a gente desce do pau-de-arara, pensa que nunca mais vai conseguir andar. Foi assim, debaixo dos pontapés impacientes dos meus torturadores, que fui levado para a sala ao lado, onde continuei sendo torturado na “cadeira do dragão”. Pés e mãos atados aos pés e braços da cadeira, como no pau-de-arara, continuei submetido a choques, espancamentos generalizados, 'telefones' e outras violências. Nunca mais vi o corpo atarracado e troncudo do meu comandante. Nunca mais ouvi a sua voz, ou mesmo os gritos de Jonas. Foi tudo ali, naquele instante mágico, de dor, de violência infernal."

Esse texto é um trecho do artigo "Jonas, um brasileiro: Testemunho sobre seu assassinato na Oban", publicado em "Versões e Ficções: O sequestro da história", editado em 1997 pela Fundação Perseu Abramo, na esteira do lançamento do filme "O que é isso, companheiro?", de Bruno Barreto, baseado no livro autobiográfico de Fernando Gabeira. Celso Horta ficou particularmente indignado (assim como os outros articulistas do livro e muitos mais que se manifestaram de alguma forma naqueles anos em que as redes sociais eletrônicas engatinhavam) com a imagem que o filme traçou de Jonas, codinome do potiguar  Virgílio Gomes da Silva, que estava no comando do sequestro do embaixador dos EUA Charles Burke Elbrick, em setembro de 1969.

O filme retratava "Jonas" como impiedoso, cruel, até insano, o que, segundo os que o conheceram, em nada correspondia ao seu jeito de ser e lidar com os companheiros. Horta não se conformava com as coisas mostradas no filme, Gabeira, à época, não contestou - disse que havia um acordo com Barreto e o roteirista Leopoldo Serran de não interferir na produção, e o diretor reconhece certas "liberdades poéticas".

O livro lançado pela FPA foi uma tentativa de se resgatar a história pelo ponto de vista dos que a viveram (e sobreviveram).

Horta, que participou da ação, foi capturado quase no mesmo momento em que Jonas, foi barbaramente torturado nas dependências da Oban, que antecedeu o DOI/Codi, na rua Tutóia, nos deixou nesta sexta-feira, 21 de abril de 2023, feriado de Tiradentes, aos 74 anos.


domingo, 26 de março de 2023

Shake it up, baby! Os 60 anos de 'Please Please Me'

Em 22 de março de 1963, "The Beatles" lançavam na Inglaterra seu primeiro Long Playing (LP), "Please Please Me". Eu, nem dois anos de idade completados, pirei com aquele som. No colo de mamãe Hirde, dando aquela mamada matinal, ouvi estupefato: "One, two, three, four... Well, she was just seventeen / You know what I mean"... Não entendi nada, claro, mas aquela voz que mais tarde soube ser de Sir James Paul McCartney causou um colapso em minha pueril mente que, de pronto, me fez largar o bico do peito maternal e balançar as ainda frágeis e arqueadas ancas.

"Misery" veio arrebatar meus ouvidos ao conhecer um dueto em perfeita harmonia. Mas "Anna" me mostrou que Lennon tinha uma dor no peito que só muitos anos depois, ao conhecer sua história, pude vislumbrar entender.

"Chains" me apresenta a voz miúda e os dedos ágeis de George, que se tornaria algum tempo depois meu Beatle favorito. Aí vem Ringo com "Boys", o narigudo da batera que, muitos anos depois, é celebrado ligeiramente em um episódio da série "Outlander".

"Ask me why" encantou meus ouvidos com aqueles "ai, ai, ai" pronunciados por John e emoldurados pelo coro de Paul e George...

Aí vem a faixa-título, já lançada anteriormente em single (no meu tempo, compacto simples): "come on, come on, come on..." Aquele eu bebê nunca mais quis saber de leite depois disso...Por favor, me agrade... com algo mais... Rs...

Papai Chico vira o disco e vem "Love me Do"... Esse o primeiro sucesso dos Fab4. Eu me lembro! Já ficava fascinado com a voz aveludada de Macca, que muitos anos após minha pequena Iracema também apreciaria. Aquela gaita (harmônica) de John pontuando tudo.

"P.S. I Love You" tem um ritmo quente, mostrando que Ringo sabia das coisas. E a harmonização das vozes? Uma criança não podia ficar indiferente. Eu não fiquei. Quis pouco depois imitar aquilo com minhas irmãs, Vilma e Sônia, sem sucesso.

Aí vem "sha-lá-lá"... "Baby, It's You", mostrando o puta cantor que Lennon é.. E dizem ainda que o cara estava com um baita resfriado! Volta George, meio fanho, com "Do You Want to Know a Secret", com um balanço que me acompanharia pouco tempo depois nos bailinhos em que eu mais gostava de ouvir do que de dançar...

Aquele gosto de mel, com Paul, me soava estranho ("A Taste of Honey")... Muito Macca anos 1970 para meu gosto (quando John o chamou de compositor de 'tolas canções de amor'). Mas tem uns momentos legais...

"There's a Place" é animada, fazia o bebê aproveitar e liberar aquele xixi básico só pra se livrar da fralda chata e a mamãe passar o talquinho fresquinho...

Para fechar a obra, "Twist and Shout". Nossa! Quando John, na frente da rainha Bete, mandou a ricaiada balançar as joias, e quando, tempos depois, Matthew Broderick fez aquele cover em "Curtindo a Vida Adoidado", firmou essa canção como o arquétipo de Beatles de sua época. Eu ao ouvir isso bebê me tornou um menino, jovem, homem e ancião feliz.

P.S. I love you, Beatles...