O Barquinho Cultural

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sábado, 21 de setembro de 2019

Ponha um arco-íris na sua moringa

O título é de uma velha canção do pernambucano Paulo Diniz, anos 70. Cara anda meio sumido -  meio, não, totalmente. Música alto-astral, solar, litorânea. Há quem veja aí algo alienante, dada a época barra-pesada em que surgiu...

Deviam ser assim mesmo aqueles tempos. A turma da MPB puta com os cabeludos e suas guitarras. Mas aí eram anos 60. Nos 70, eu já adolescendo, os que partiram para a luta armada presos, exilados ou mortos.

A música brasileira com outros contornos. Gente fingindo ser gringa, cantando em inglês. Mas os fodões - Caetano, Gil, Chico - voltam do "passeio" involuntário ao exterior e fazem coisas ótimas. E começam a surgir outros grandes compositores: Luiz Melodia, Walter Franco, Jards Macalé, Raul Seixas, Sérgio Sampaio, Djavan, Gonzaguinha, Tim Maia...

Eu me lembro bem dos anos 70. Estava na cidade grande, São Paulo, e acompanhava bastante o que a indústria fonográfica estava fazendo, pois comprava e vendia discos. Na TV, aquela coisa: Chacrinha, Silvio Santos, Raul Gil, Nelson Motta, Big Boy.

Paulo Diniz estourou com "Quero voltar pra Bahia", em 1970, creio, dele e de Obidar. Confessadamente escrita para homenagear Caetano, à época em Londres. Ouvia-a muito por aí: nas rádios, TV, nos serviços de alto-falantes dos parques. Eu tinha 9 anos, gostava do ritmo, do jeito de Paulo cantar. Não entendia o sentido da letra. Parece que nem os censores.

No começo da década de 70, o general-presidente era Médici, falava-se em Milagre Brasileiro. A vida parecia boa. O moral da nação buscava ser erguido com coisas como Dom e Ravel cantando aqueles ufanismos todos ("Eu te amo, meu Brasil"); nos para-brisas dos carros o adesivo dizia: Brasil: Ame-o ou Deixe-o - aliás, quantos carros tinha, hein! Nunca vira tantos, e fabricados aqui, lá no ABC.

Mas, por que escrevo sobre essa música de Paulo Diniz?

Porque está complicado botar um arco-íris na moringa ultimamente. Qualquer tentativa de relaxar, viver um pouco a vida de maneira leve, corre-se o risco de ser chamado de alienado, conformista, ou, pior, cúmplice - por omissão - de "tudo que está aí".

Tipo uma obrigação de tomar posição, de opinar, de marcar posição, de se pronunciar, mostrar indignação, preferencialmente nas ditas redes sociais virtuais. Enche, sabe! Quando o que muitas vezes quero é, sim, tomar uma geladinha em frente à TV ou à beira da piscina. Ou brincar com minha pequena filha, tomar um picolé, ou mesmo ver um desenho de que ela goste em casa.

Errado isso? Não, mas aí você olha o celular e vê zilhões de postagens altamente "engajadas" comentando, protestando, criticando a última medida tomada ou bobagem dita pelo governante ou um de seus asseclas - ou filho...

Ou então seu "feed" é entupido com milhões de textos, vídeos, áudios com opiniões fundamentadas, dizendo aquilo que você quer dizer mas não consegue elaborar com tanta inteligência...

É a dose de opinião fundamentada necessária para seu vício em tomar posição. Sem ela, você pode se sentir isolado, sozinho nesse mundo em que: será que sou o único a me indignar com isso?

Cada dia, ou cada hora, ou minuto... uma nova polêmica. É preciso dizer algo a respeito, mostrar o quanto estou puto com isso, marcar minha posição, se possível, ganhar alguns "likes", melhor ainda se alguns compartilharem essa posição, sinal de que "mandei bem". Mundo estranho esse.

Eu estou fora. Evito isso aí. Até porque não estou com saco para entrar em polêmicas, em discussões - provavelmente com robôs - que inevitavelmente surgirão.

Prefiro, sim, botar um arco-íris em minha moringa e ficar lelé da cuca sem medo de ser feliz...

Vai o link da música.

https://youtu.be/7su1j7lnO0o

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