O Barquinho Cultural

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quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Catarina Dee Jah: vem de Olinda a surpresa!

“Cata, cata, cata, cata, cata, Catarina / Eu bem que te falei pra não bulir com estricnina” (Amufinada)

Ela vem de Olinda. A surpresa. Frevo? Caboclinho? Não, mas sim! É isso, não há como não notar nas entrelinhas, entretons, algum sinal. Influência. Mas, só que não. A fonte dela é o mundo. Lusamérica latim em pó. Mangue beat de Chico Science e Mundo Livre S/A. É pop, mas também é coco, é cumbia, xote, reggae, e brega. Sim!

Ao ouvi-la pela primeira vez, na Festa da Shana, na Saravejo, a mistura bem misturada, as bases criativas, a postura... Senhora de si. Bradando contra o feminazi. Ela canta, aí faz a festa. Traz vinis (sim, em plena era i-tudo, ela vem com seus bolachões) de todo o Norte, todo o Nordeste, relembra Eliana Pittman e seu carimbó, sirimbó.

Traz de Olinda a surpresa. Pra nosso deleite, nós, paulistanos, cansados da mesmice, da mediana média que sem medida nos mede qual medíocres. Ela não. Traz alegria, essa alegria quente, regada a caldinho de codorna. Com cachaça. Mas não se presta a ser apenas mulher tira-gosto. Postura.
Catarina Dee Jah, ou MC Ririca, ou Riddin... Ela agora está de vez em São Paulo. Vem cavar seu espaço, que já o tem.

A agenda está boa. Apresenta-se agora três vezes no evento da Prefeitura de São Paulo Mês da Cultura Independente. Toca em outros points também. É ir ver, ouvir, dançar e pirar.
Catarina, somsual. Vulvas em fúria. Agora, take it easy. Se você a incomodar, ela manda você se ferrar e tomar no ...

Quer saber a biografia dela? Dê um Google, veja seu charmoso site. Lá tem o Mulher Cromaqui – seu primeiro trabalho (em sua definição, ‘um trocadilho, uma ironia com toda essa exaltação e frenesi às mulheres frutas, as aberrações do mundo onde tudo é manipulável e efêmero’) -  para baixar. Aqui, a entrevista que ela, carinhosamente, concedeu ao blog. Vamos conhecer um pouquinho de seu pensamento, de seus planos.

BLOG POR BLOGA - Você está se estabelecendo de vez em SP? Quais suas expectativas em relação à cidade?

CATARINA DEE JAH – Eu já conheço a cidade, desde 1998 que eu venho pra cá, uma cidade que eu sinto que as pessoas... a praia do paulista é a cultura, e eu trabalho com cultura, então eu sinto que há um feed back maravilhoso aqui e, além de tudo, uma valorização do trabalho. Se você vem focado em trabalhar de maneira honesta você se desenvolve. A cidade te dá essa oportunidade. Eu vim de uma cidade menor, uma cidade pequena, de muro baixo, onde o profissionalismo não fala tão alto, na verdade eu acho que as relações são mais importantes do que o profissionalismo, e o que eu gosto em São Paulo é que ele sempre me dá um choque, uma maturidade muito boa, eu dou uma crescida muito grande. Tem muitas oportunidades aqui, eu estou a fim disso neste momento.

BLOGA - O que pretende fazer aqui: mais festas, discotecando e cantando? Promover seu CD?

CATARINA – Eu lancei um disco independente (Mulher Cromaqui), e foi um disco que foi bem recebido, e eu acho bem louco porque os dados são bem díspares assim, um disco que teve 13 mil downloads nos primeiros seis meses, eu não avaliei ainda com o cara que agenciou o site para saber como é que está, mas foi um disco lançado totalmente independente e atingiu essa casa dos 13 mil downloads em seis meses, eu acho louvável, você, sem pagar uma estrutura de assessoria de imprensa e coisa e tal. E aí o que eu faço? Não estava conseguindo trabalhar lá em Pernambuco, porque é uma cidade que é distante desse eixo, e os festivais estão muito morgados, no Brasil os editais estão muito caretas, então eu resolvi vir pra cá e refazer esse começo que eu vivenciei, que era da Milícia dos Radicais Livres, que era uma milícia musical, músicos que tocam comigo, e é sempre um recomeço você readaptar as músicas, sair um pouco dessa zona de conforto. Além desse formato com a banda, eu estou com um formato digital, que é a MC Ririca, que é mais baile e bases eletrônicas, e tem o Riddin, que eu eu chamo de ‘Riddinculous’. São bases que eu produzi com amigos da Argentina, de alguns selos de lá, também são produzidos com um cara do Equador aqui de São Paulo, e algumas bases que eu reeditei com meu DJ, que ficou em Recife. Fora isso, tem também o trabalho de pesquisa musical, eu tenho um acervo de vinis, tenho discotecado aqui em algumas festas e também trabalho com MP3, eu estou  pra tudo, estou fazendo jardinagem... Só não sei bater laje (ela não falou, mas me mostrou: também desenha, faz ilustrações, um traço muito bom).

'Tem que haver mais amor e compreensão'


BLOGA - Como vê a cena independente atual? Você criticou em uma entrevista a “lenda urbana dos editais”, o investimento maciço em “arenas”, que chamou de retrocesso, a subutilização de espaços, só ocupados em época de carnaval... O artista tem que cavar seu próprio espaço? A coisa está muito “mainstream”?

CATARINA – Cara, dizem que a indústria das gravadoras está em ruína, mas eu acho que na verdade se apropriaram dessa revolução digital, se apropriaram de algumas coisas, de alguns canais de divulgação que a gente tem hoje em dia e as coisas não mudaram pouco. Os editais, que antigamente eram fomento, estão sustentando e sub-sustentando artistas que eram de gravadoras até então. E as pessoas que estão começando e que realmente têm um trabalho independente não têm muita vez. Fora que há uma nova MPB, não sei, que eu acho que são pessoas extremamente competentes, tocam bem, cantam bem, tem estrutura, mas que não emocionam, parece que fazem uma música no formato para tocar na Nova Brasil FM, e é uma rádio que de nova não tem nada, porque toca o quê? Música de 20, 30 anos atrás ou releituras dessas músicas. Então a gente ainda tem essa deficiência do rádio. E eu acho que em São Paulo, apesar disso, você tem muito acesso a investimentos da iniciativa privada, que é uma coisa que falta lá no Nordeste, e existe uma cena independente que consegue se sustentar também. Tem estúdios aqui que você pode ensaiar e tocar e tirar uma grana com a bilheteria. Tem casas que têm uma estrutura profissional; é só uma postura de você saber também criar uma estrutura profissional para lhe acompanhar, não abrir mão muitas vezes de um técnico de som, está entendendo? Ensaiar bem, ter bons músicos, parceiros. Tem a estrutura do Sesc, que é um grande diferencial aqui em São Paulo, a estrutura do Sesc em outras cidades é subutilizada, o único lugar que eu vejo que acontece isso no Brasil é aqui. Ao mesmo tempo, o Sesc de São Paulo fica com a arrecadação quase toda do Nordeste. A gente estar tocando aqui não é nenhum favor também.

BLOGA - O que quer dizer com “feminismo bem-humorado e passional”? O que quer dizer isso? Alguma observação a respeito do tom do movimento feminista?

CATARINA – Na verdade eu acho que tanto o feminismo como o machismo está numa crise de identidade imensa. Eu adoro regalia que o machismo me dá, por exemplo, o cara pagar a conta do motel, do jantar, abrir a porta, puxar a cadeira para eu sentar, eu acho o galanteio uma coisa maravilhosa, e isso é confundido com machismo. Ao mesmo tempo, as mulheres adoram gozar do direito de pagar menos pra entrar numa balada. Eu fiz uma festa em que homem entrava de graça até meia-noite, e foram pouquíssimos homens, porque falaram que ia só dar homem. Foi engraçado... Eu gosto de brincar com esses comportamentos. Eu não me identifico nem com o movimento feminista, que às vezes fica um ‘feminazi’ muito grande, parece que é uma raiva do homem, sabe, eu adoro os homens, adoro meu marido, meu filho, meu pai, e acho que há uma opressão também, acho que as mulheres têm também que baixar um pouco a guarda e entender seu coração, suas próprias necessidades, sua sensibilidade. Acho que não é essa onda de direitos iguais... Direito igual importa direito ao voto, à escolha do trabalho, à escolha profissional, do que vai estudar, várias escolhas, mas existem diferenças entre os homens e as mulheres, de sensibilidade e de condições físicas mesmo, que acho que têm que ser respeitadas, tem que ter equidade, na verdade, acho que a gente está caminhando pra isso, mas acho que ambas as partes têm que relaxar mais, a gente está passando por uma era meio extrema e acho que tem que haver mais amor e compreensão. As pessoas têm que aprender a ceder mais, ambas as partes.

BLOGA - Vc tem opiniões firmes, posicionamentos. Integrou-se ao movimento Ocupação Estelitahoje (16/09) comentou sobre essa desocupação de um prédio na praça da República, criticou a nossa era, altamente empresarial, perda de valores. Como vê o atual momento político? Estamos a poucos dias da eleição e Pernambuco está no centro, com a morte de Eduardo Campos. Você acredita em transformações por meio do voto? Como se define politicamente?

CATARINA – Eu acho que, por exemplo, hoje a gente tem visto muito essa mistura de religião com política, essa luta pelo Estado laico. Acho que tanto na religião como na política você tem que ter coerência, você tem que olhar para seu próprio umbigo, não adianta você fazer discursos e não ter a prática. E existem práticas que a gente tem que exercer diariamente, isso é ser cidadão. O problema é que o povo brasileiro anda revoltado porque a gente tem uma carga onerosa imensa nas nossas costas e os serviços são muito ruins, principalmente no Nordeste, que a gente vê que o custo de vida está muito alto e os serviços estão muito ruins. E isso vai gerando revolta, realmente. Eu acho que a gente está passando por um momento político muito complicado, mas acho que a política tem que ser exercida além das urnas. O povo está na rua exigindo seus direitos, essas ocupações têm que ser melhor assistidas. Tem um monte de gente entediada aí que está acabando de se formar em Ciências Sociais, tem que estar engajada nessa história toda. A gente está vivendo um momento muito punk também, além do ‘lobby’, por exemplo, a gente vê a história do Brasil, o ‘lobby’ que teve dos Estados Unidos em cima da ditadura e da indústria do petróleo, que fodeu com todo nosso sistema ferroviário, a gente está vivenciando agora um caos, que é produto disso tudo. As cidades criaram nós, os carros ainda estão de maneira defasadíssima sendo exaltados, essa indústria automobilística, que eu acho que é uma coisa que já devia ser refreada... Existem consequências? Existem, mas é a nova ordem, tem que investir muito em mobilidade, em mobilidade pública... A questão da especulação imobiliária é terrível também. Eu vejo isso tanto em Olinda, uma cidade que é um centro histórico, onde eu vivo, a cidade está fantasmagórica, porque as pessoas que eram realmente colonos, que viviam lá, estão abrindo mão de estar nas casas porque não têm grana nem acesso a crédito barateado e facilitado para restaurar suas casas da maneira correta, então se torna uma vida onerosa, precária, elas estão vendendo essas casas para mecenas que as utilizam simplesmente no carnaval para camarote de empresas e a gente não vê mais uma vida espontânea como se tinha na cidade da maneira que existia mesmo, de pessoas que vivem lá e que são agitadores culturais, que vivem a boemia da cidade, que utilizavam os serviços da cidade. A gente vê isso em micro e macroescala. O problema do Estelita foi porque eles sucatearam a área ferroviária de lá, existem aqueles galpões que são mausoléus da indústria da monocultura do açúcar, que ainda perdura... O boia-fria até pouco tempo ganhava 13 reais por uma tonelada e meia de cana. Ao mesmo tempo ele tem força e reação para fazer o maracatu rural, tomar azougue, que é a cachaça com pólvora... Como dizia  Glauber Rocha: ‘ a cultura popular é o grito primal de resistência de um povo’. E esse leilão lá foi fraudulento, eles querem construir um paredão de prédios na beira-rio do canal. Após todo esse clamor e esse grito da população, dos ativistas, o projeto se readaptou, a gente ainda não está satisfeita, porque é praticamente uma Dubai em Recife. É uma pena que a elite que detém o poder e o dinheiro no Brasil seja tão cafona e tão colonizada, que imita modelos ruins e fadados à falência. A gente ainda vivencia a questão do cabresto, do crivo à educação, à saúde, ao povo, e isso atravanca, as pessoas se tornam massa de manobra ainda para votar no cabresto, e isso reverbera em tudo, até na adoração que o oprimido tem ao opressor, como falava Paulo Freire. Então a gente precisa mudar as coisas de maneira muito brusca em atitudes realmente assim de foco e de informação. Parem de ler tanto a internet, tanto a Wikipedia, e vão ler livros, porque acalma, informa, está entendendo? E faz dormir gostoso.
'Parem de ler tanto a internet, a Wikipedia; leiam livros'

BLOGA - Qual sua agenda? Tem as apresentações do Mês da Cultura Independente da Prefeitura, a festa no Pratododia, e que mais? O que SP pode esperar de você?

CATARINA – Eu cheguei agora, ontem dia 15, aqui, e já estou ensaiando com a banda nova, esta semana será toda de ensaios Dia 18 vou tocar no boteco Pratododia, uma honra tocar naquele lugar que eu gostei muito, é um respeito ao DJ de vinil, vai ser com meu companheiro de pesquisa Maurício Fleury, que eu tenho a maior admiração por ele; na sexta (19) eu tenho o Terminal Nova Cachoeirinha, que é o formato “MC Ririca”, junto com o DJ Ad Ferrera, que é outro parceiro; na mesma noite eu toco no Zé Presidente, participo como MC Ririca também dividindo o palco com a Camila Garófalo; no sábado (20) eu toco na Festa Mel, que é na Dom José Gaspar, também por esse festival de cultura independente; nesse mesmo dia tem o show da Academia da Berlinda, no Belenzinho, talvez eu dê uma pintada lá pra tocar com os meninos;  semana que vem, dia 27, vai ter também no Centro Cultural São Paulo, na rua Vergueiro, com Maria Alcina e Lurdes da Luz, vai ser um show bem especial pra mim, e tem mais data em outubro, muita coisa configurando na agenda, já está batendo um monte de coisa. É isso, estou superfeliz de estar me desenrolando nesta cidade.

BLOGA – Aí você fica atualizando no site para as pessoas acompanharem. E essa banda é toda lá de Olinda?


Catarina e os novos Radicais Livres: Faraco, Índio, Lelinho e Carranca

CATARINA – É gente de toda parte. O Faraco (Felipe Faraco, teclados) é de Porto Alegre, Lelinho (Lello Bezerra, guitarra) é de Caruaru, Carranca (Hugo Carranca, bateria), é das Olinda, e Índio (David Índio, baixo) é de São José do Rio Preto, onde eu toquei, no Sesc.

SERVIÇO:

Festa El Delírio -  Boteco Pratododia – Rua Barra Funda, 34, Barra Funda. Quinta, 18/09, a partir de 21h

TerminalNova Cachoeirinha – Sexta, 19/09, a partir de 17h. Grátis

Espaço Zé Presidente – Rua Cardeal Arcoverde, 1.545, Vila Madalena. Sexta, 19/09, a partir de 21h

FestaMel – Edição especial Ilha das Flores – Praça Dom José Gaspar, República. Sábado, 20/09, a partir das 19h. Grátis

Academia da Berlinda -  Sesc Belenzinho – Rua Padre Adelino, 1.000, Belenzinho. Sábado, 20/09, a partir das 20h

CentroCultural São Paulo – Rua Vergueiro, 1.000, Paraíso. Com Lurdez da Luz e Maria Alcina. Sábado, 27/09, a partir de 19h. Grátis

Ouça aqui o áudio da entrevista (com direito a palhinha de 'Peba na Pimenta'):
 



Ouçam e vejam seu mais recente vídeo, "Vem que vem":

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