O Barquinho Cultural

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terça-feira, 9 de novembro de 2010

Cinco vezes Brasil

Fui nesta segunda-feira, 08, assistir ao filme Cinco Vezes Favela - Agora Por Nós Mesmos, composto de cinco episódos dirigidos por vários integrantes de comunidades no Rio de Janeiro, que participaram de oficinas ministradas por grandes diretores do cinema brasileiro, como Nelson Pereira dos Santos, Ruy Guerra, Walter Lima Jr., Daniel Filho, Walter Salles, Fernando Meirelles, João Moreira Salles e outros. O filme, coordenado por Cacá Diegues e sua mulher Renata Magalhães, retoma a ideia de montagem de mesmo nome produzida em 1962 a partir de concepção de Cacá e Leon Hirszman, entre outros, e também com vários diretores, co-produzido pelo Centro Popular de Cultura (CPC) da UNE. O filme, muito bom, por sinal, busca retratar o dia a dia nas favelas - hoje chamadas de comunidades - e os conflitos ali estabelecidos, principalmente entre os moradores, os traficantes e a polícia. Apesar de o tema estar presente em outras produções recentes, como Cidade de Deus, Tropa de Choque 1 e 2 e Era Uma Vez, este tem a diferença de ser realizado e encenado por moradores dessas comunidades (apesar de contar com atores profissionais também), mostrando seu olhar sobre a situação que vivem, de forma que o distanciamento crítico que o cinema se impõe às vezes neste fica prejudicado, uma vez que a abordagem é mais instrínseca. O interessante é que o maniqueísmo é deixado de lado e a realidade nua e crua é exposta sem grandes arroubos sociológicos, sem muita explicação. E o filme não aborda apenas a questão do tráfico e a violência policial, mostra a vida desse pessoal de uma maneira, se não romantizada, de forma realista e com alguma carga de poesia. Fonte de renda, dirigido por Manaira Carneiro, aborda a situação de um jovem que conseguiu passar no vestibular de Direito e, agora, precisa arcar com os gastos com livros, transporte e alimentação para realizar seu sonho. As dificuldades acabam por fazê-lo envolver-se com o tráfico. O episódio, longe de justificar o crime, expõe a tênue linha que separa essas duas realidades. Arroz com feijão, de Cacau Amaral e Rodrigo Felha, conta a história de um menino que quer dar de presente ao pai um frango no dia de seu aniversário, porque a família, às voltas com os gastos da construção de um quarto para ele, tem de comer apenas esse alimento, sem mais nada. O garoto sai, então, à luta de cinco reais para realizar seu desejo e encontra muita dificuldade para tal. E acaba cometendo um roubo, do qual se reabilita no final, mostrando que a ética e a honra não são uma questão de condição social. Concerto para violino, de Luciano Vidigal, retrata a amizade de três crianças que, ao crescer, tomam caminhos diferentes. Quando pequenos, os dois meninos e a menina fazem pacto de eterna amizade. Adultos, um cai no tráfico, a garota estuda violino e se prepara para uma bolsa de estudos na Europa e o terceiro se torna policial. A vida os faz reencontrarem-se em uma situação limite que terminará em um tragédia. É o mais denso de todos, em minha opinião. Deixa voar, de Cadu Barcellos, tem como pano de fundo a rixa entre facções nas favelas, mas sem se aprofundar. Coloca mais a questão da coragem em contraste com o medo e a superação dos percalços em nome da realização de um objetivo. Um rapaz deixa voar a pipa de um amigo, que vai cair na comunidade vizinha, onde os que moram do lado de cá não vão, e vice versa - cada lado acreditando que a incursão no outro lado é arriscado. Acontece que o amigo exige que ele vá buscar o brinquedo. Acende a luz, de Luciana Bezerra, é o único que não aborda nenhuma espécie de crime, mas lida com o medo que se tem de entrar em uma comunidade dessas. A falta de luz em uma comunidade na véspera do Natal leva funcionários da companhia de eletricidade ao local para o conserto. Uma primeira equipe vai embora sem resolver o problema de uma parte mais distante e de difícil acesso. Vem então outra equipe e um dos técnicos sobe ao local. Lá, a comunidade cai matando, exigindo que ele faça o serviço. Acontece que falta uma peça, e o colega que ficou no carro vai embora. O funcionário é feito refém ali até fazer a luz voltar. O interessante é ver os moradores rirem do medo do coitado, que imagina que está em um covil de traficantes. Enfim, é um filme de forte conteúdo social e que tem o grande mérito de lançar um olhar despretensioso sobre uma realidade que não é de toda conhecida.

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