O Barquinho Cultural

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sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Algo lá atrás


Confesso que ando meio nostálgico, e quem porventura me lê não precisa ficar aguentando minhas reminiscências, mas não consigo, neste momento, escrever nada mais atual, ou moderno, ou contemporâneo. Mas, afinal, memórias são algo atual, pois referem-se a lembranças, hoje, de tempos passados. E na maioria das vezes permitem que revisemos algo que ficou lá atrás e sigamos em frente com, talvez, um pouco mais de sapiência, dada pela experiência. Pois isso me ocorre agora, quando reouço (existe esse verbo?) músicas que havia tempos não ouvia. Ontem foi outro Vandré, novamente graças ao companheiro (esse termo também faz tempo que não emprego) Eduardo. E ouvi também, de novo por conta dele, Raíces de América. Bem, nos tempos que esse grupo de canções latino-americanas existia, eu preferia o Tarancón, na mesma linha. Porque achava este mais, digamos, engajado que aquele, muito pop star, global (teve até uma atriz da Globo nele, recitando poesias) para meu/nosso gosto. Nunca fui um show deles e nem um disco comprei. Mas Tarancón não perdia um: Míriam Mirah, Jica, Turcão e Emílio, além do pintor Halter (bem, essa era a formação que eu vi, nos anos 80; eles se formaram em 72, creio). Tenho vários discos deles. Não estou, com isso, dizendo que o Raíces seja ruim; não são. É apenas uma questão de gosto: Emilinha/Dalva; Beatles/Stones, por aí. Mas ouvi-los trouxe-me de volta esse período e reflexões sobre o que eu fazia naquela época, sonhos que tinha, perspectivas, o que eu era... Eu sofri uma revolução na minha maneira de ser e pensar logo depois de terminar o serviço militar. Olha, eu, enquanto recruta, cheguei a alimentar idéias de seguir carreira. E logo em seguida abracei o que se costumava chamar de corrente progressista da sociedade (ah, não posso dizer que era comunista porque não era do tal partidão e nunca li mais que dois capítulos de O Capital, e mesmo assim em espanhol e para um trabalho de faculdade; nem posso dizer que era de esquerda, porque minha ação era meio encabulada, nunca apanhei da polícia nem fui preso, tampouco pichei um muro contra os banqueiros ou o imperialismo). Mas minha militância resumiu-se a visitar umas favelas para tomar um choque de realidade (como se eu morasse muito melhor que eles) e apresentar uma peça de Dias Gomes (A Invasão) à guisa de levar alguma consciência crítica aos moradores (como se tivéssemos muita). Enfim: pode-se dizer que eu era um membro da famosa "massa de manobra". Ah, e como fazíamos muita festa, pois éramos jovens (de idade, quero dizer), pode-se também dizer que pertencíamos a uma certa "esquerda festiva". De qualquer forma, foi um belo salto: de recruta com sonhos carreiristas a um projeto de revolucionário. Hoje, revisão feita e observando o cenário atual, posso dizer que pertenço ao grupo dos que foram da esquerda e não ficaram ricos e/ou famosos. Melhor para mim.
Outra razão de eu estar nesse clima foi que reli um negócio que escrevi há muito tempo, coisa de uns 10, 12 anos. Era um projeto de um conto, quem sabe um romance. Eu sempre alimentei um pouco a idéia de escrever algo além dos textos que faço ou refaço para minha subsistência. Mas sempre me faltou ou idéias ou disciplina... Ou talento. O certo é que abandonei o texto, que escrevia nos momentos vagos na hora do trabalho (quando não havia internet nem MSN para nos ocupar o tempo). Ainda bem que tive a sábia idéia de imprimir o que tinha escrito quando saí de lá. Quer dizer, ainda bem por quê? Se tiver alguma serventia hoje, quem sabe. Acabaram mesmo as idéias naquele tempo e retomar agora seria complicado, acho, porque eu estava experimentando naquele texto uma linguagem diferente, um cenário que eu não conheço. Muito fake. E nem estruturei direito o que queria fazer. Fui escrevendo, sem destino. Teria, portanto, de pensar em um desenvolvimento a partir de onde parei, rever a linguagem e o contexto, pôr mais tempero naquilo, que está apenas um exercício de estilo, quando muito. Quem sabe eu não retome mesmo o projeto, ou quem sabe eu não retome pelo menos o projeto de escrever algo mais que o do sustento e o que posto aqui... Quem sabe (faz a hora, não espera acontecer...)

Um comentário:

Edu M disse...

Melhor para vc e para todos aqueles que te querem bem! Ninguém precisa ser rico e famoso para ser bom, correto. A memória é um bicho estranho, muito seletivo. Memória de editor, então nem se fala. Se o editor é competente e exigente como vc, aí a coisa pega. Dizem que a memória dos jovens é muito focada no curto prazo e dos velhos no passado. Ecléa Bosi discute isso em "Memória e Sociedade" (vale a pena ler). Mas memória é relembrar para ter prazer, para matar a saudade, para rir e chorar, de coisas boas. Para isso existe o esquecimento. Sem não houvesse o esquecimento, para que nossos erros sejam jogados no breu eterno de onde vieram, não haveria civilização, não haveria relacionamento que perdurasse. Não haveria história, não haveria amor. Viver se tornaria insuportavelmente pesado. A raposa de Saint Expery as vezes tem pintado por ai. Mande ela de volta para os livros, a escrota!