O Barquinho Cultural

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terça-feira, 6 de abril de 2010

A noite

Sábado, bar Metrópolis, avenida Paulista, cerca de 23h. Hesito à porta, medo de entrar. Dou uma volta pela Doutor Arnaldo, contorno, pego a Consolação, viro na Fernando, subo a Haddock, retorno à Consolação e, decidido, resolvo entrar. Vou ao estacionamento, dezoito paus! Mas a chave pode ficar comigo. Na porta do bar, alguns frequentadores, mais jovens que eu, diversidade de roupas. Acho que estou adequado com minha camisa de mangas curtas de padrão xadrez, verde, e o jeans, harmonizando com meu sapato preto confortável presente de aniversário de minha filha. Entro, vinte e cinco paus de cara, sem direito a consumação. Quarenta e três paus gastos até agora sem um pingo de diversão, fora o combustível. Lugar quase lotado, mas o som bem bacana, a cargo da banda Almanak, tocando rocão básico dos 70, 80. Assim que entro, percebo olhares em minha direção, curiosos apenas. Creio que não abafei. Vou para o fundo procurar minha amiga. Não a encontro. Fico perto do bar. Curto o som, vejo a fauna local. Pessoal na casa dos 30, nada de meninada. Olho o cardápio. Preços, como era de esperar, exorbitantes. Seis reais uma simples Cerpa. Dezesseis um Red Label. Decido por um Jack Daniels, já que estou na chuva. Pancada de mais de dezessete pilas! Mas tomo com gosto, já ao lado de minha amiga e a amiga dela, com quem já dividimos outras pistas. A ideia era aproveitar o ambiente e curtir a night. Mas não me dou bem nesses lugares, e em pouco tempo já estava querendo ir embora. Ainda mais que a amiga, com quem já fomos um pouco mais do que amigos, parecia que queria que eu deixasse o caminho livre e fosse tentar a sorte em outra freguesia. Tomei uma Cerpa e a conversa com ela foi fluindo e em pouco tempo mudou de direção. Duas da manhã, já sem esperança de que o desfecho fosse outro, aconteceu o previsível. Fomos embora (a conta fechou em 59,95), tomar um lanche no Osnir, lá na Jabaquara. Comi um hipercalório xis bacon egg salada com fritas acompanhadas de maionese. Ela comeu um xis com muito tártaro e a amiga, um sanduba de frango. Despedidas e para casa. Acabei a noite na solidão das salas de bate-papo, em busca de algum diálogo noturno para afastar a sensação de que a noite fora desperdiçada. No fundo, mesmo, a noite foi boa, como me disse depois aquele que eu pago para me ouvir: pelo menos saiu de casa, já é um bom começo.

Domingo chuvoso. Após churrasquear com minha família, e de ter ligado para minha filha e sabido que ela havia chegado bem de sua programação, vou para o centro deixar encomenda para prima de minha filha, em um hotel perto da estação Júlio Prestes. Erro o caminho, como sempre, e me embrenho na Cracolândia. Aquilo é impressionante. Quem ainda não viu, não pode imaginar o que seja. Aquelas pessoas maltrapilhas amontoadas nas calçadas, no meio de toneladas de lixo, queimando as pedras de crack e entrando na mais profunda e perigosa nóia que um sujeito pode entrar. Seres perdidos, abandonados, esquecidos, nenhuma política pública parece que chega perto deles. Ultimamente tenho ouvido na imprensa vozes se erguendo contra essa verdadeira epidemia que é o vício do crack, mas não sei o que tem sido feito pelos órgãos públicos, se é que algo há a ser feito. Sei que dá pena de ver aqueles jovens, meninos, meninas, moços de todas as idades, naquela situação deplorável, minando seus corpos a cada tragada dessa droga maldita, vivendo como urubus - foi essa a imagem que me veio à mente ao vê-los ali no meio daquela imundície - sob a fina chuva daquela noite. Depois dessa visão, só posso achar que minha noite de sábado foi realmente maravilhosa.

5 comentários:

Edu M disse...

Não sou uma esfinge mas tente decifrar o enigma: qual a diferença da net e do crack? Quem busca a net e o crack estão ali para se entorpecerem, não? Deixam a vida real para trás e mergulham numa viagem, em que o tempo pára, (ou se perde tempo) em que a autossatisfação está no ato de estar ali, aqui e agora. Não existe futuro. Existe?

Carlos Mercuri disse...

Vc tem razão, a net vicia, mas nem chega perto da nóia desses fissurados em crack, que espetáculo terrível....

Sandra Evangelista disse...

Oi Carlos, nem sempre nossa vida está tão ruim como imaginamos, né?
Muito triste viver sob o domínio de um vício.
Como sempre, sua riqueza de detalhes faz com que a gente imagine a cena, como se estivéssemos lá.
Bjo. Flor

Isabel Cristina disse...

(...só posso achar que minha noite de sábado foi realmente maravilhosa.)

Olá amigo, saudades!!!
Que bom que a conclusão de suas aventuras foi essa, e comece a parar de colocar pêlo em ovo...
EU PENSO que essas coisas estão acontecendo justamente para nos lembrar disso - o quão maravilhosos somos, se podemos fazer algo façamos, se não... respeitamos, de repente essas pessoas que julgamos sofrer, se sentem maravilhosas, vai saber!?

Te amo meu amigo e tenha um dia iluminado!!!

isabela disse...

aquele lugar é mesmo horrivel.. :(