O Barquinho Cultural

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sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Despejo na favela

Hoje comemora-se o centenário de nascimento de Adoniram Barbosa, nome artístico de João Rubinato, que nasceu em Valinhos (SP) e morreu em 23 de novembro de 1982 em São Paulo. Tenho uma história singela com esse grande compositor e cronista da cidade de São Paulo. Em 1982, quando montamos a peça A Invasão, de Dias Gomes, precisávamos de uma música para tocar em um dos momentos chave da obra. Joãozinho sugeriu Súplica Cearense, mas não conseguimos encontrar o disco (naquele tempo o mp3 era coisa de filme futurista). Então o Tim, do grupo Forja (grupo de teatro do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema), veio com Despejo na Favela, de Adoniram. Fui atrás e encontrei um LP homenagem, e a música era interpretada por ele e por Gonzaguinha (um de nossos ícones, qualquer dia falo do show que ele fez em São Bernardo contratado pela Associação de Compras Comunitárias do ABC). A canção ilustrou as cenas finais da peça, quando os invasores de um prédio do governo são expulsos pela polícia. Ela serviu direitinho. Melhor reproduzir a letra do que escrever qualquer coisa. Só digo que, se já gostava dele, fiquei mais vidrado depois de ouvir todas aquelas canções tão simples e tão complexas. Adoniram foi um grande poeta dos desvalidos, do amor puro, do cotidiano. Vai a letra:
Quando o oficial de Justiça chegou
Lá na favela
E contra o seu desejo
Entregou pra seu Narciso
Um aviso, uma ordem de despejo
Assinada "Seu Doutor"
Assim dizia a petição:
"Dentro de dez dias quero a favela vazia
E os barracos todos no chão"
É uma ordem superior
ô, ô, ô, ô, meu senhor
É uma ordem superior
Não tem nada não, seu doutor
Não tem nada não
Amanhã mesmo vou deixar meu barracão
Não tem nada não
Vou sair daqui
Pra não ouvir o ronco do trator
Pra mim não tem problema
Em qualquer canto eu me arrume
De qualquer jeito eu me ajeito
Depois, o que eu tenho é tão pouco
Minha mudança é tão pequena
Que cabe no bolso de trás
Mas essa gente aí
Como é que faz?
ô, ô, ô, ô, meu senhor
Essa gente aí
Como é que faz?

6 comentários:

Edu M disse...

você já notou como o adoniran é legalista? ele sempre aceita a ordem de cima.....em Iracema, o "condutor" não teve culpa...., em Despejo da Favela, a ordem é superior; em Saudosa Maloca, "os homi tá com a razão.."... adoniran não luta, ele aceita sempre. até em trem das onze... Ele não pode ficar nem mais um minuto por conta do trem...

Carlos Mercuri disse...

É verdade, mas acho que isso é mais um conformismo que uma atitude legalista. É como se ele retratasse o homem comum como passivista. Realmente, o homem cantado por Adoniran não é um lutador. Já quanto ao homem Adoniran não tenho informação para dizer se ele era um conformado. Grande abraço.

Edu M disse...

Recentemente fui entrevistar o Pelão, o produtor do Adoniran, e ele tinha vários brinquedos feitos pelo Adoniran, de madeira. Tinha uma bicicleta que era uma graça. E o chapéu de feltro pendurado na estante. Devia ser uma pessoa sensível.

Concordo com vc. Legalista nao foi uma palavra correta para descrever o homem. Conformista é melhor. Acredito que Adoniram e seu pensamento refletem a classe trabalhadora da época, a base da sociedade, que não tinha nem força nem informação para lutar. Tem gente que diz que Adoniran era malandro etc. Discordo: Adoniran era trabalhador, subempregado...

Carlos Mercuri disse...

Ah,no LP que eu tenho dele tem um encarte com fotoss desses brinquedinhos que ele fazia. Muito delicados mesmo, o que indica que Adoniran era mesmo um homem sensível.

isabela disse...

ele era simplesmente igual a milhares de brasileiros que vivem situações injustas e, por falta de informaçao ou estímulo a entender porque passam por isso, apenas aceitam.. é o que lhes resta! beijo pai

Carlos Mercuri disse...

É mesmo filha, um cara simples, mas com um olhar muito apurado para as coisas da vida. Beijão.